OMISSÃO DE SAÍDAS
Apurada Mediante Prova Emprestada
RECURSO Nº 1.218/95 - ACÓRDÃO Nº 1.560/96

RECORRENTE: (...)
RECORRIDA: FAZENDA ESTADUAL (Proc. nº 012003-14.00/94.0)
PROCEDÊNCIA: PASSO FUNDO - RS
EMENTA: ICMS

Impugnação a Auto de Lançamento.

A omissão de saídas de mercadorias tributadas, além de outras fontes de apuração, pode ser determinada com base em informações do próprio contribuinte, inclusive prestadas em juízo, podendo o Fisco efetuar o lançamento alicerçado em provas emprestadas. Qualquer modificação nas informações prestadas, que vise reduzir imposto ou excluí-lo, por parte do sujeito passivo, deve ser fundamentada (art. 147, CTN). Furtou-se a defesa, em oferecer elementos, que autorizem estabelecer outra base de cálculo e que abrande o impacto da exigência inicial, resta bem lançado o imposto com seus acréscimos, fundado nas declarações (processo judicial - fls. 56 a 70) e outros elementos apontados na peça impositiva (fls. 71, 73 a 79).

Negado provimento ao recurso voluntário, por maioria.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de recurso voluntário, em que é recorrente (...), de Passo Fundo (RS), e recorrida a FAZENDA ESTADUAL.

Foi constituído o crédito tributário, através do Auto de Lançamento nº 8049400130, lavrado contra o recorrente em 26 de abril de 1994, com a exigência de imposto e multa, pelo não pagamento do imposto, ou pagamento a menor, quando este operava no ramo de restaurante, cadastrado como microempresa, referentemente ao período de 1º de janeiro a 31 de julho de 1992.

Desconforme com a imposição fiscal, dentro do prazo, por procurador habilitado, requer o cancelamento da exigência contida na peça impositiva, sob a alegação de que, o Auto de Lançamento se baseou em prova fornecida por seu inimigo; que as informações são tendenciosas e fantasiosas; que o informante nunca teve acesso a seus livros contábeis e que não corresponde a verdade as informações prestadas pelo presidente do Clube, ao Fisco. Questionou também o preço arbitrado pela autoridade autuante às refeições. Contesta, outrossirn, o número das refeições diárias, atribuído pelo Fisco, em seu restaurante, e alega não corresponder a realidade o informado pela diretoria do clube.

O autor do procedimento, em réplica, confirmou seu entendimento exposto na peça, com justificativa na sua constituição em elementos, como processo judicial (fls. 56 a 70), onde consta declaração, prestada pelo recorrente, de quantidade de refeições fornecidas por dia; declaração do autuado do valor e do peso médio de cada refeição (fl. 71); informações prestadas pelo Clube (pessoa jurídica), onde o impugnante opera o seu restaurante (fls. 73 a 79) e documentos fiscais do contribuinte.

O Julgador Singular, em decisão (fls. 95/97), com fundamento nas razões prestadas pela autoridade autuante, julgou procedente a peça fiscal, tendo destacado que o lançamento tributário deve ser analisado de acordo com as provas que o fiscal autuante se valeu para a lavratura do mesmo. Referiu-se ao uso destas provas, assim: "Valeu-se o Fisco do conteúdo da contestação do processo judicial nº 21193017304, no qual (fl. 61), a respeito do negócio do impugnante foi dito que ‘... inegavelmente o melhor restaurante da cidade de Passo Fundo, pois, além de atender as mais requintadas e tradicionais festas de casamento, formaturas, aniversários e outras, mantém atendimento ao público, no sistema à Ia carte e, nos últimos tempos, instalou o mais concorrido restaurante em quilo, o qual serve, em média, 340 almoços diários, ...’, ‘... Quando o demandado iniciou a locação não existia este magnífico e lucrativo restaurante em quilo, hoje uma verdadeira ‘máquina de ganhar dinheiro’ em Passo Fundo". O impugnante tenta invalidar essa prova, que foi extraída de processo judicial, afirmando que houve um equívoco na informação do número de refeições fornecidas por ele. No entanto, não traz elemento probante que possa confirmar a sua tese. De acordo com o interesse imediato muda suas afirmações, hora exaltando as qualidades de seu negócio, ora diminuindo o potencial do seu restaurante. Concluindo: além de não fazer prova do que alega, contradiz-se em informações. As informações prestadas pela Diretoria do Clube Recreativo Juvenil relacionando os eventos realizados pelo restaurante e número de pessoas participantes (fls. 56 a 70) devem ser aceitas, já que o autuado, novamente, nada trouxe aos autos que pudesse afastar a validade das referidas informações. Em vista deste entendimento manteve o crédito constituído.

Desconforme com a decisão, dela recorre o sujeito passivo, com observância dos requisitos básicos de sua admissibilidade, com reprodução dos argumentos expendidos na inicial. Diz que o Julgador monocrático não considerou as razões da impugnação, sem referir ao fato de que a empresa concede férias coletivas nos meses de janeiro e fevereiro de cada exercício. Informa que o Fisco efetuou plantão em seu estabelecimento para aferir a quantidade de refeições que seriam servidas naquele dia, constatado um total de 104, qualificou de exagerado número de almoços atribuídos pelo Fisco de 340, já que o restaurante não abria à noite. Registra que o Fisco não possuía dados concretos quanto ao número de festas e de participantes e nem o preço das refeições. Que, a autoridade autuante valeu-se de mero subjetivismo e não baseou-se em critérios ponderáveis e justos. Que, não foi considerado o fato do salão ter sido locado inúmeras vezes, oportunidade em que somente fornecia as bebidas. Entende ser necessário reformar a decisão, porque está baseada em meras suposições, todas despidas de provas, e ainda, alicerçada em xerox que não serve de prova de confissão e prestadas de forma equivocada.

A representante da Fazenda Estadual junto a este Tribunal, opina pela mantença da autuação, em sua íntegra, inclusive quanto à multa aplicada, ratificando a fundamentação aduzida pelo juízo "a quo".

É o relatório.

Passo a decidir:

A singela referência de que xerox de documentos insertos nos autos da Ação Judicial na 21193017304, não têm a força de servirem como elementos basilares à constituição de crédito tributário não é suficiente para afastar a imputação. O que interessa é o efetivo conteúdo do seu original. Não negou o recorrente a sua procedência e veracidade. Pois, estas cópias xerográficas, que se referiam a declaração prestada pelo sujeito passivo à justiça comum, dando conta do movimento e rentabilidade de seu estabelecimento comercial.

O Fisco, com espeque nas declarações do próprio sujeito passivo, corroboradas posteriormente pelas declarações do ente jurídico onde funcionava o restaurante do comparte, qual seja, (...), concluiu pela omissão de saídas tributadas por parte do contribuinte. Com base na própria informação exigiu o Fisco o imposto relativamente a média de saídas de 340 refeições diárias, embora o contribuinte na impugnação admita tão-só 48, sem no entanto oferecer qualquer elemento persuasivo de tal ocorrência, limitando-se a negar o índice adotado no lançamento. Parece que o contribuinte tem uma declaração para cada situação, ora valorizando o restaurante, ora diminuindo, segundo seu talante e vantagens que possam advir, contudo sempre se furtando as provas.

Não prospera a versão de que a informação prestada pela Diretoria do Clube era de inimigo seu, pois, estariam em demanda judicial, visto que a pessoa jurídica não pode apresentar inimigos, e suas informações são impessoais, em atendimento de intimação da autoridade fiscal. Ao contrário, os elementos fornecidos pelo presidente do Clube, não receberam manifestação do autuado, que poderia rejeitá-las e apontar irregularidades, dado a riqueza de seus detalhes, ficou na cômoda situação de vítima.

A vista dos elementos colhidos nos autos, a versão fiscal, lastreada em informação do contribuinte, e mais, no que dispõe o artigo 147, do CTN, que determina qualquer alteração concernente a declaração do próprio sujeito passivo, com vistas a reduzir o montante do imposto a pagar, seja a nova versão provada a contento, para em não o sendo, prevalecer a informação original. A alegação de eventual equívoco, relativo a quantidade de refeições servidas diariamente, para agora reduzir drasticamente, com isso proporcionalmente reduzir o crédito tributário, não é permitido pelo Código Tributário Nacional, artigo supra, com o que confirmo o crédito tributário constituído com base na informação primeira.

A Lei do Procedimento Tributário Administrativo, autoriza ao juiz, cujo voto foi vencido, querendo, também, oferecer seu voto por escrito, para integrar o acórdão, assim, Pedro Paulo Pheula se posicionou:

- De início, o Julgador Singular, ao fundamentar sua decisão, julgando procedente o Auto de Lançamento, afirmou:

"Deve o presente lançamento tributário, para que seja aferida a sua correção, ser analisado em seu ponto basilar, qual seja, o das provas em que a autoridade autuante se valeu para a lavratura do mesmo.".

Em seguida, afirma o Julgador que: "Valeu-se o Fisco do conteúdo da contestação do processo judicial nº 21193017304..." (fl. 95).

A autoridade autuante, na justificativa de constituição do crédito tributário, confirmando a afirmação do Julgador Singular, registra que a omissão de saídas, no período de 1º de janeiro a 31 de julho de 1992, foi apurado "... com base na declaração prestada no processo judicial nº 21193017304 fl. 53), pelo próprio autuado".

Trata o documento antes referido de contestação à demanda de despejo, nos autos do processo nº 21193017304, onde aparece como autor o (...) e réu o ora recorrente, (...).

Cumpre examinar, inicialmente, se esta prova, em que o fiscal autuante se valeu para a lavratura do Auto de Lançamento, atende os requisitos legais, para a condenação do autuado.

Entendo que não.

Tratam-se de cópias não autenticadas por oficial público, portanto sem validade.

Refere-se a processo judicial a despejo onde o objeto da causa é totalmente estranho ao do presente litígio.

Naquela ação discute-se, no mérito, ‘Direito de Indenização pelo Fundo de Comércio’, portanto, justificável os argumentos do locatário em defender o êxito do negócio. É evidente que, naquela ação, o importante era defender o sucesso do empreendimento.

Assim, as declarações do ora autuado naquela ação, não têm o condão de autorizar o Fisco à lavratura do Auto de Lançamento. Por estas razões, tal documento, por si só, não pode ser admitido como prova contra o autuado.

Por outro lado, as informações prestadas pela Diretoria do Clube Recreativo Juvenil relacionando os eventos realizados pelo restaurante e número de pessoas participantes (fls. 56 a 70), não podem ser aceitas.

A prova carreada aos autos dá conta de que além da Ação de Despejo promovida pelo (...), contra o autuado, mais duas ações foram ajuizadas contra o mesmo, a de nº 21193015787 (consignatória) e a de nº 21193020720 (Reintegração de Posse), que já foram julgadas em favor do ora recorrente (fl. 04).

Portanto, confiável a informação do recorrente de que a Diretoria do Clube é sua inimiga capital.

Por isso, endosso as afirmativas do ora recorrente no sentido de que ‘as informações que ensejaram a lavratura do Auto de Lançamento ora impugnado, são pelo menos, tendenciosas, eis que prestadas por inimigo, suspeito e parte interessada em ver a ruína do impugnante.".

Na forma do artigo 405, § 3º, III, do CPC, o inimigo é considerado suspeito e, portanto, está impedido de prestar depoimento ou esclarecimento a respeito de fatos relacionados com seu adversário.

Além disso, face ao disposto no artigo 368 do CPC e seu parágrafo único, ditas informações não servem de prova e, portanto, imprestáveis para embasar a autuação impugnada.

Inservíveis tais documentos como prova para embasar a lavratura do Auto de Lançamento e sustentar sua eficácia, não há como julgá-lo procedente.

A mera convicção dos agentes do Fisco, não é suficiente para ensejar o juízo condenatório.

O Juiz deve julgar as verdades contidas nos fatos e nas provas que lhe são apresentadas, de forma imparcial e sem ferir os preceitos legais.

Por essas razões, voto pela improcedência do Auto de Lançamento, dando provimento ao apelo do recorrente."

Do julgamento efetuado em 31 de maio de 1996, resultou empatado, tendo os juizes relator e Oscar Antunes de Oliveira provido o recurso, enquanto que, os juizes revisor e Adalberto Cedar Kuczynski, negaram provimento. Em face ao empate, o Presidente prolatou seu voto em sessão do dia 07 de junho de 1996, nos seguintes termos:

VOTO DE DESEMPATE

"Trata-se de Auto de Lançamento decorrente da omissão de saídas praticadas pelo Recorrente, cadastrado como microempresa.

Apoiou-se o Fisco em declarações judiciais efetuadas pelo autuado e em informações prestadas pelo (...), além de diligências realizadas pela Fiscalização do ICMS.

Impugnou o Recorrente o lançamento alegando engano ocorrido na peça judicial de sua autoria, e que as informações nas quais baseou-se o Auto, foram prestadas por ‘inimigo’ seu, sendo portanto suspeitas.

São duas versões distintas dos mesmos fatos e o deslinde da questão decorre de optar pela mais consistente.

Na verdade, a alegação de engano na peça processual não convence eis que o erro refere-se apenas ao número de refeições, deixando de lado todos os outros detalhes que valorizaram sobremaneira a rentabilidade do restaurante explorado pelo recorrente. Frize-se que foi o mesmo advogado que redigiu ambas as petições.

Também a alegação de inimizade padece de dúvida, porque as ações judiciais foram propostas por e contra pessoa jurídica, o (...). Por outro lado, as informações foram prestadas em decorrência de intimação fiscal (fls. 72) ao mesmo Clube e respondidas pelo Sr. (...), na qualidade de seu Presidente.

Diz o C.P.C., art. 405 - III, que é suspeito o inimigo capital. Não pode ser considerado como tal, a pessoa jurídica que defende judicialmente seu interesse ou que atende intimação legal. Tão pouco praticou ato de hostilidade pessoal o Presidente do Clube ao propor ação de despejo contra o recorrente, apenas defendeu o interesse da entidade.

Não se pode ainda entender como ação reveladora de inimizade a prestação de informações em atendimento à intimação legal.

Diga-se de passagem, que o recorrente não refutou, "quantum satis", os termos das referidas informações.

Ademais, há, nos autos, controvérsia sobre a área do restaurante, o número de mesas, etc., a respeito do que não juntou o recorrente nenhuma prova.

Impressiou-me, porém, o número de refeições diárias atribuídas ao restaurante. Não encontrei prova cabal a respeito, nem nas alegações do recorrente nem nas do Fisco.

Considerando, pois, tudo o que foi antes dito, parece-me conveniente que se dê nova oportunidade para que a situação seja discutida e apresentadas provas suficientes para dissipar todas e quaisquer dúvidas.

Entendo que o assunto merece uma apreciação pelo Judiciário, o que poderá ser feito apenas se negarmos provimento ao recurso. A nova apreciação dar-se-ia através da execução fiscal, nos termos da Lei nº 6.830/80, ou pela propositura de ação anulatória de débito fiscal. Se fosse dado provimento ao recurso com cancelamento do auto de infração, poderíamos estar acobertado a prática de sonegação pelo recorrente.

Assim sendo, pedindo vênia ao eminente relator, juiz Dr. Pedro Paulo Pheula, cujo brilhante voto muito me fez meditar sobre a matéria, nego provimento ao recurso, acompanhando a posição do preclaro Juiz Revisor, Dr. Plínio Orlando Shneider, que lavrará o respectivo Acórdão".

Ante ao exposto, ACORDAM os Membros da Segunda Câmara do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais, por MAIORIA, vencidos os Juízes Pedro Paulo Pheula e Oscar Antunes de Oliveira, negar provimento ao apelo facultativo, tendo o Presidente votado com os Juízes Plínio Orlando Schneider e Adalberto Cedar Kuczynski.

Porto Alegre, 07 de junho de 1996.

Plínio Orlando Schneider
Relator Designado

Rômulo Maya
Presidente

Participaram, também, do julgamento os Juízes: Oscar Antunes de Oliveira, Adalberto Cedar Kuczynski e Pedro Paulo Pheula. Atuou no feito, ainda, a Defensora da Fazenda Pública Estadual, Marcolina Maria Gerevini Dias.

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