BASE DE CÁLCULO
RECURSO Nº 708/92 - ACÓRDÃO Nº 106/94
RECORRENTE: (...)
RECORRIDA: FAZENDA ESTADUAL (Proc. nº 18880-14.00/92.9)
PROCEDÊNCIA: GUAÍBA - RS
EMENTA: IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES RELA-TIVAS À CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS (ICM).
Base de cálculo.
Constitui-se em infração à legislação estadual a tributação de operações de circulação de mercadorias pelo valor histórico contratado em período anterior à ocorrência do fato gerador do imposto. Tal prática, por efeito, entre outros fatores, da desvalorização da moeda, provoca débito do imposto a menor do que o devido, já que não submetido à tributação o valor real da operação de que decorreu a saída da mercadoria.
Preliminar rejeitada à unanimidade.
Negado provimento ao recurso voluntário por voto de desempate da presidente.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de recurso voluntário, em que é recorrente (...), de Guaíba (RS), e recorrida a FAZENDA ESTADUAL.
Em nome da ora recorrente, em 28 de agosto de 1991, foi lavrado o Auto de Lançamento nº 5569100039 (fl. 57 e seguintes do processo nº 18.929-14.00/91.2), dada a ciência em 30.08.91, exigindo o recolhimento de ICM e multa por infração material. Consoante o Anexo do Auto de Lançamento, a contribuinte reduziu o montante do imposto a pagar creditando-se indevidamente de ICM(a) e emitindo documentos fiscais consignando valores inferiores aos da real operação (b). Neste caso, o Fisco acusa que a empresa tributou operações de saídas de elevadores pelos preços históricos, sem considerar adequadamente a correção monetária prevista nos contratos, já que a entrega dos produtos sempre se deu, em média, de 6 (seis) a 12 (doze) meses após a contratação, quando ocorreu o fato gerador do imposto.
A empresa, inconformada, impugnou o lançamento referindo, quanto ao item "a", que bem antes efetuara denúncia espontânea de infração e que pagara o imposto e acréscimos devidos no caso. No concernente ao item "b" afirma que suas operações derivam de contrato atípico, onde assume a obrigação de entrega futura do bem e que se trata de venda a prazo com reajustamento do preço, inclusive após a saída da mercadoria. E, assim sendo, diante dos artigos 74, 77 e 96 do Regulamento do ICM, entende não ter praticado infração já que não há determinação de atualizar o valor do bem quando da sua saída e nem há obrigação de emissão de documentação fiscal para simples faturamento. Seguindo sua defesa, reitera que as operações de que cuidam os autos são de compra e venda para entrega futura e que tais operações são reguladas por dispositivos específicos, os quais não foram considerados pelos autuantes. Nesse sentido, transcreve doutrina e jurisprudência deste Tribunal, a qual entende pertinente à espécie.
Por outro lado, contesta os exemplos arrolados pelo Fisco no Anexo do Auto de Lançamento, apresentando demonstrativos alternativos com os quais procura provar a lisura do seu procedimento.
Por último, contesta a graduação da multa aplicada "... já que quanto mais não fosse, se trataria da interpretação de normas jurídicas e não de sonegação." (sic).
Nesses termos, requerendo, ainda, realização de perícia contábil, busca a decretação da improcedência do Auto de Lançamento.
As autoridades autuantes, em réplica fiscal de fls. 138 a 159 do processo original, reconhecem ter havido denúncia espontânea da infração descrita no item "a", mas esclarecem que somente houve pagamento parcial do valor exigido na peça fiscal. Assim sendo, feitas as correções necessárias, propõem a subsistência parcial dos valores exigidos neste item e a exclusão das parcelas correspondentes ao já alcançado aos cofres do Estado.
Passando ao item "b", em extenso e profícuo arrazoado, as autoridades autuantes mantém seu posicionamento inicial enfatizando que a Base de Cálculo do ICM é o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria e não o valor histórico do contrato de fornecimento de elevadores, como teria procedido a autuada. Esclarecem que, com base nos contratos firmados, é fácil determinar o valor efetivo da operação, que decorre da atualização das parcelas, à data da saída da mercadoria, com os índices fixados nos próprios contratos. Assim, rechaçam os argumentos trazidos na impugnação, dizendo inaplicáveis os preceitos legais invocados pela autuada e comentando a capitulação legal citada na peça fiscal. Mais adiante, contestam um a um os demonstrativos apresentados na impugnação e, para melhor elucidar seus argumentos, transcrevem outros casos ocorridos na empresa e que refletem, segundo os mesmos, a prática da sonegação fiscal.
No Departamento de Processos Fiscais, com fundamento nos argumentos expendidos à fl. 160, o Julgador indeferiu a produção de prova pericial requerida. Em seguida, forte no Parecer Técnico de fls. 161 a 189, o Dr. Leon Loreto Pereira, julgou parcialmente procedente o crédito tributário constituído. Diante da denúncia espontâ- nea de infração foi decretada a insubsistência parcial do item "a" e, quanto ao item "b", permaneceu inalterada a exigência tributária.
Dada a ciência da decisão acima e inconformada com o seu teor, a recorrente interpôs recurso a este Tribunal, buscando a reforma do julgamento singular (fls. 02 a 28).
Inicialmente noticia ter havido decisão judicial com o trânsito em julgado, a qual declarou inexigível o ICM sobre serviços de instalação dos elevadores. Como tal decisão altera a base de cálculo do imposto estadual requer que a mesma seja levada em conta no presente julgamento. Por outro lado, por ter pago indevidamente o ICM sobre os serviços de instalação dos elevadores, entende fazer jus ao creditamento a partir dos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação declaratória e informa que está procedendo ao levantamento do seu crédito que será demonstrado através de prova pericial. Refere que há nulidade parcial do Auto de Lançamento já que nele, quando da determinação da base de cálculo do imposto, foi incluída a parcela correspondente ao serviço de instalação dos elevadores.
Defende, de outra parte, que é nulo o Auto de Lançamento ao fazer uso de indexador (TRD) instituído por lei manifestamente inconstitucional. Diz, também, ser nula a peça fiscal por quanto ausentes os pressupostos legais para o arbitramento das operações. Entende não incidir na espécie o art. 37, inc. Ii, da Lei nº 6.485/72 e art. 357 e seus incisos do Decreto nº 33.178/89, porque a sua escrita fiscal e os documentos emitidos não contêm omissões ou vícios que evidenciem sonegação de imposto e nem o registro de valores lançados a menor.
Prosseguindo na sua defesa, diz que houve cerceamento do direito de defesa vez que o Julgador de primeiro grau indeferiu o pedido de produção de prova pericial. Invoca doutrina e jurisprudência, reforçando seu entendimento de que lhe é assegurada a avaliação contraditória.
Mais adiante, voltando-se para a matéria de fundo, repisa sua posição adotada na inicial onde defende que no seu caso trata-se de venda para entrega futura e que são aplicáveis os artigos 96 e 77 do Decreto nº 29.809/80. Faz uma extensa análise destes dispositivos legais para, ao final, concluir que não incorreu em irregularidade tributária e que não há diferença de imposto a ser recolhida.
Por último, quanto à penalidade, afirma que não há como enquadrar a hipótese em exame em qualquer das alíneas do inciso I, do art. 8º, da Lei nº 6.537/73, bem como não se poderia imputar à autuada conduta dolosa ou de má-fé afastando-se a multa material. Invoca, ainda, o art. 112 do Código Tributário Nacional, chamando a si o princípio "in dúbio pro reo", para, ao final, dizer que diante da inocorrência de sonegação e retardamento do pagamento do tributo, a multa, se devida, seria de cunho formal.
Manifestando-se a respeito, o Defensor da Fazenda pede a rejeição das questões preliminares argüidas e, quanto ao mérito, valendo-se do já exarado tanto na réplica fiscal como no Parecer Técnico do Departamento de Processos Fiscais, propõe o desprovimento do apelo facultativo.
É o relatório.
VOTO.
Manifesto-me, inicialmente, quanto à preliminar propriamente dita, expressa no argumento de que teria havido cerceamento do direito de defesa da recorrente, eis que indeferido o pedido de produção de prova pericial. Neste sentido, entendo, também, como prescindível a realização da perícia pretendida. Note-se que todos os elementos constantes no processo foram extraídos dos livros e documentos da empresa e a base de cálculo do imposto foi elaborada tendo presente os contratos firmados pela empresa, com índices por ela utilizados. Ademais, de registrar que eventuais dúvidas foram devidamente esclarecidas na réplica fiscal.
Assim, desnecessária a realização da perícia pretendida, rejeito a preliminar de cerceamento do direito de defesa.
No mérito, quanto ao item "a" da peça fiscal, não trouxe, a recorrente, qualquer argumento no sentido de contestar o julgamento de primeiro grau. Destarte, resta apenas confirmar a subsistência parcial decretada, nos exatos termos em que consta na decisão recorrida.
No que tange ao item "b" do Auto de Lançamento, ainda que na impugnação a recorrente tenha dedicado parte de sua defesa na contestação da matéria de fato, procurando demonstrar, inclusive através de exemplos, que não deixara de recolher imposto nas operações de que cuidam os autos e contestando os casos transcritos no lançamento, agora, em grau de recurso, não houve manifestação tendente a confirmar sua tese de início esposada. Preocupou-se, isto sim, em demonstrar, através da interpretação da legislação tributária aplicável, que referidas diferenças não estariam sujeitas à tributação do ICM.
Nesse passo, superada a matéria de fato, resta examinar a situação fática apresentada à luz da legislação tributária vigente à época (Lei nº 6.485/72 e Decreto nº 29.809/80 - Regulamento do ICM).
Deflui dos autos que a recorrente, com indústria de fornecimento e instalação de elevadores, estabelecia contratos com seus clientes onde, em regra, eram obedecidas as seguintes condições: o preço acertado era pago em parcelas mensais, reajustadas por índices estipulados entre as partes (IGP, OTN, ABDIB) e a entrega dos elevadores era efetivada, em média, de 06 (seis) a 12 (doze) meses após a assinatura do contrato. Para documentar as operações, eram emitidas Notas Fiscais nas quais, como valor da operação, era consignado o valor histórico do produto, de início contratado. Sobre os reajustamentos a contribuinte emitia faturas em relação às quais eram emitidas algumas Notas Fiscais. Cabe, então, definir qual a base de cálculo do imposto: o valor histórico da mercadoria, com eventuais acréscimos de reajustamento; ou o valor da mercadoria por ocasião da sua saída do estabelecimento. São estes os fatos.
Para dirimir a questão necessário se faz registrar os seguintes aspectos: o fato gerador do ICM, no caso dos autos, ocorre na saída da mercadoria do estabelecimento industrial (art. 1º, I, da Lei nº 6.485/72); e o fato gerador está estreitamente vinculado com a definição da base de cálculo do imposto. A matéria, aliás, foi bem analisada pelo Parecerista do Departamento de Processos Fiscais (fls. 175 a 179), o qual, inclusive, citou farta doutrina acerca do assunto. A título ilustrativo transcrevo algumas partes:
"A base de cálculo do imposto - ... - é o valor básico, relacionado com o seu fato gerador, que, através da operação matemática de multiplicação pela alíquota, indicará a quantia do imposto a recolher."
(Fernando A. Brockstedt, in "O ICM - Legislação Federal Unificada". p. 219).
"Também o fato gerador é decisivo para a definição da base de cálculo do tributo, ou seja, daquela grandeza econômica ou numérica sobre a qual se aplica a alíquota para obter o quantum a pagar.
Essa base de cálculo tem que ser uma circunstância inerente ao fato gerador, de modo a afigurar-se como sua verdadeira e autêntica expressão econômica.
É certo que nem sempre há absoluta identidade entre uma e o outro. Dizem os escritores que tal simultaneidade ou identidade perfeita entre fato gerador e base de cálculo só é encontrada nos aspectos sobre a renda e sobre o patrimônio.
Não obstante, é indispensável configurar-se uma relação de pertinência ou inerência da base de cálculo ou fato gerador: tal inerência ou pertinência afere-se, como é óbvio, por este último.
De outro modo, a inadequação da base de cálculo pode representar uma distorção do fato gerador e, assim, desnaturar o tributo."
(Amilcar de Araújo Falcão, in "Fato Gerador da Obrigação Tributária", p. 155 e 156).
"A base de cálculo está tão vinculada ao fato gerador que ela é sempre uma decorrência deste, isto é, ao ser criado um tributo com a descrição de uma situação, a base de cálculo há de ser a grandeza econômica ou numérica dessa mesma situação descrita, sem o que haveria uma distorção: o tributo não seria sobre o fato descrito porque a base de cálculo não seria a expressão econômica em avaliação do respectivo fato, fenômeno ou relação fática."
(Ruy Barbosa Nogueira, in "Curso de Direito Tributário", Ed. Saraiva p. 136)
Verifica-se, então, para que não haja uma distorção do tributo, a necessidade de a base de cálculo ter estreita ligação com o fato gerador e seja sua expressão econômica real. E tal preocupação da doutrina vem escrita na própria Lei nº 6.485/72 a qual, em seu art. 12 e § 1º, preceitua:
"Art. 12 - A base de cálculo do imposto é:
I - o valor da operação de que decorrer a saída ou o fornecimento da mercadoria;
...
§ 1º - Na compra e venda, ressalvadas as disposições desta Lei em contrário, o valor da operação compreende a importância total paga pelo comprador, inclusive o montante de todos os encargos ou despesas realizadas para a entrega ou remessa da mercadoria ao adquirente, bem como bonificações e demais vantagens auferidas pelo vendedor."
Feitas essas considerações e transpondo-as para o caso em concreto a conclusão inevitável é de que a empresa não agiu em consonância com as determinações legais e que o Fisco bem buscou o imposto que deixou de ser alcançado aos cofres do Estado. A contribuinte, ao tributar as operações pelo valor histórico e não pelo valor da operação de que decorreu a saída da mercadoria, estabeleceu uma dissociação entre base de cálculo e fato gerador, acarretando débito do ICM em valores substancialmente inferiores aos devidos, o que se agravou ainda mais considerado o regime inflacionário em que vive nosso País.
Apenas para ilustrar a distorção tributária que causou o procedimento da empresa, trago a lume dois contratos celebrados pela autuada com seus clientes:
- Contrato nº 14.871, firmado em 28.08.87, no valor de CZ$ 900.000,00, sendo as parcelas vencidas após a data da assinatura reajustadas até seu efetivo pagamento de acordo com a variação do IGP. A saída do elevador objeto da transação se deu em 18.08.88, conforme Nota Fiscal nº 7.709, série A-1, e o valor consignado foi aquele acordado quase um ano antes (CZ$ 900.000,00). Segundo a peça fiscal (fl. 60) o valor médio de venda dos elevadores no Estado, em agosto de 1988, quando ocorreu o fato gerador do ICM, era de CZ$ 5.071.131.31, conforme demonstrativo elaborado pela empresa, denominado "Venda de Elevadores Faturados". Vê-se, assim, mesmo consideradas algumas Notas Fiscais emitidas por conta dos reajustamentos (CZ$ 629.456,96), que a empresa tributou a operação em níveis bem inferiores aos devidos.
- Contrato nº 14.880/81, firmado em 21.09.87, referente ao fornecimento de dois elevadores. Ficou acordado que o pagamento seria efetuado em parcela única, em 30.04.88, o que de fato ocorreu já que, em 29.04.88, a empresa recebeu CZ$ 4.743.555,05 (equivalente a 4.983,95 OTNs). Os elevadores começaram a ser entregues em agosto de 1988 e o somatório das Notas Fiscais emitidas até a entrega total das mercadorias (novembro de 1988), quando ocorreu o fato gerador do imposto, correspondeu a CZ$ 2.002.000,00. Por este exemplo se vê que sequer foi tributado o valor histórico. E mais, atualizando os valores contratados à época da ocorrência do fato gerador do ICM, deduzindo o valor do IPI, o correto teria sido tributar a operação pela base de cálculo de CZ$ 9.462.577,25 (demonstrativo de cálculo à fl. 62).
Essa prática, devidamente comprovada nos autos e não refutada em grau de recurso, resultou no fato de que, de agosto de 1988 até setembro de 1990, a empresa sempre apresentou saldo credor nas suas Guias de Informação e Apuração do ICM/ICMS, nada recolhendo a título de imposto, a não ser em razão das importações. Neste mesmo período, apenas para se ter uma idéia, a contribuinte emitiu faturas por conta de suas vendas em montante superior a NCZ$ 20.000.000,00, sendo que submeteu à tributação apenas NCZ$ 4.092.014,06 (fl. 59).
Nesses termos, resta claro de que a empresa não submeteu à tributação o valor da operação de que decorreu a saída das mercadorias e o Auto de Lançamento nada mais fez do que repor os fatos em consonância com a Lei. E não refuta esta realidade toda a interpretação dada pela recorrente aos arts. 77 e 96 do Decreto nº 29.809/80, através dos quais busca justificar como correto seu procedimento. O que deve ser observado, antes de mais nada, é o art. 12 da Lei nº 6.485/72, isto é, o que importa é o valor pelo qual a operação de circulação tenha se realizado e que este valor seja a base de cálculo do imposto. Não está a se discutir se a operação é de venda para entrega futura ou como deva proceder a empresa quando do acréscimo no valor das mercadorias após a emissão da Nota Fiscal pela saída de mercadoria. Aliás, quanto ao art. 77 do Decreto nº 29.809/80, bem salientaram as autoridades autuantes quando enfatizaram que referido dispositivo diz respeito a valores não conhecidos quando da ocorrência do fato gerador, o que não é o caso dos autos, eis que os valores tributados em complementação já eram conhecidos naquele momento (fl. 152).
No que tange à inconformidade da recorrente quanto ao arbitramento adotado na peça fiscal para a determinação da base de cálculo do imposto devido em cada operação, considerando que não houve a abordagem deste assunto na impugnação, passa a ser questão prejudicada eis que carece do necessário prequestionamento. Contudo, apenas para esclarecer, entendo que a recorrente faz confusão quando diz que todos os elementos estiverem à disposição do Fisco, ao comparar contratos com escritas contábil e/ou fiscal (fl. 25). Conforme já foi demonstrado, a empresa emitiu faturas sem correspondentes Notas Fiscais, bem como consignou valores completamente defazados nas Notas Fiscais que documentaram as operações. Tais procedimentos são mais do que suficientes para habilitar o Fisco a buscar o valor real de cada operação e tributar a diferença (Art. 37, II, da Lei nº 6.485/72). De destacar, ainda, que a base de cálculo do imposto em cada operação foi apurada tendo presente os próprios elementos constantes nos contratos da empresa, o que em momento algum foi contestado.
Quanto ao uso da TRD no Auto de Lançamento como fator de atualização monetária, como bem observou o Defensor da Fazenda (fl. 38), é questão superada neste Tribunal por torrencial jurisprudência uniforme, onde a manifestação sempre tem sido no sentido de ter como legal o uso da TRD como indexador, porquanto regularmente instituída por lei. Não prospera o argumento da recorrente ao pretender a sua inaplicabilidade sob o pretexto de que a lei instituidora seria inconstitucional. A esfera administrativa não é o foro adequado para verificar inconstitucionalidade de leis, o que, aliás, já foi motivo de Súmula neste Tribunal (Súmula nº 03).
Cabe, ainda, apreciar o enquadramento dado à infração cometida e a correspondente penalidade imposta. Na peça fiscal os fatos tidos como infringentes à legislação tributária foram enquadrados nos arts. 1º, parágrafo único, "a", e art. 7º, I, combinado com o art. 8º, I, "c", 4, da Lei nº 6.537/73 e alterações. Isto é, a infração foi classificada como material qualificada para a qual é cominada a multa prevista no art. 9º, III, da já citada Lei. A recorrente defende que não há como enquadrar a hipótese nestes dispositivos e que, na ausência de lesão ao erário, a multa, se devida, seria de cunho formal. Neste sentido, cumpre observar que ficou comprovado nos autos de que a prática da recorrente causou lesão ao erário público estadual. Diante desta realidade a infração cometida foi material, afastando-se, de plano, o enquadramento pretendido pela recorrente. Assim sendo, resta definir se a infração é havido como qualificada, básica ou privilegiada. Conforme já visto, o Fisco enquadrou os fatos no art. 7º, I, combinado com o art. 8º, I, "c", 4, da Lei nº 6.537/73. Veja-se o texto do art. 8º:
"Art. 8º - Relativamente à legislação do imposto sobre circulação de mercadorias (ICM) consideram-se:
I - qualificadas, as seguintes infrações tributárias:
...
c) emitir documento fiscal:
...
4. que consigne valores diversos dos da real operação;"
Ora, quando a empresa consigna valores defazados nos documentos fiscais, que não refletem o valor real da operação, ou emite faturas sem uma correspondente Nota Fiscal, pratica a infração tipificada nos dispositivos antes transcritos. Pelo que não assiste razão à recorrente, estando o Auto de Lançamento correto também quanto a este aspecto.
Por último, de verificar os efeitos que a decisão judicial com trânsito em julgado produz sobre o crédito tributário objeto do presente litígio. Lembro que a recorrente ajuizou ação declaratória e obteve decisão no sentido de que é inexigível o ICM sobre serviços de instalação dos elevadores. Busca, em decorrência, o creditamento de imposto pago indevidamente e a nulidade parcial do Auto de Lançamento já que nele, quando da determinação da base de cálculo, teria sido incluída parcela correspondente ao serviço de instalação dos elevadores.
Novamente a razão não acompanha a recorrente. A matéria aqui em discussão é se houve tributação de operações de saídas de mercadorias pelo seu valor real, o que, conforme já analisado, ficou cabalmente demonstrado que não, daí a procedência do crédito tributário constituído. Vista a questão sob o aspecto do direito tributário vigente, não há notícia nos autos de que o lançamento tenha incluído valores a título de prestação de serviço. Aliás, se verificados os documentos analisados pelo Fisco, não se vislumbra qualquer parcela especificadora da prestação de serviço. Apenas para argumentar, se fosse atendida a pretensão da recorrente, estar-se-ia alterando o rumo deste contencioso e, neste momento, elevando o nível da discussão a patamares que escapam à alçada deste Tribunal.
Nesses termos, nego provimento ao recurso voluntário.
Ante todo o exposto, ACORDAM os membros da Primeira Câmara do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais, por unanimidade de votos, em rejeitar a preliminar argüida e, no mérito, por maioria de votos, negar provimento ao recurso voluntário, vencidos os Juízes Pery de Quadros Marzullo e Antonio José de Mello Widholzer, que deram provimento parcial para o efeito de alterar a graduação da infração de material qualificada para material básica.
Porto Alegre, 08 de fevereiro de 1994.
Renato José Calsing
Relator
Sulamita Santos Cabral
Presidente
Participaram, também, do julgamento os Juízes Pery de Quadros Marzullo, Levi Luiz Nodari e Antonio José de Mello Widholzer. Presente o Defensor da Fazenda Galdino Bollis.