IMPORTAÇÃO - RECOLHIMENTO DO IMPOSTO NA DISPONIBILIDADE DA MERCADORIA
RECURSO Nº 263/96 - ACÓRDÃO Nº 2.278/96
RECORRENTE: (...)
RECORRIDA: FAZENDA ESTADUAL (Proc. nº 26415-14.00/95.3)
PROCEDÊNCIA: GRAVATAÍ - RS
EMENTA: ICMS
Impugnação a Auto de Lançamento. Importação. Créditos fiscais. Glosa.
As ordens judiciais constantes dos autos determinam abstenção ao impetrado de condicionar à comprovação do recolhimento do ICMS o desembaraço aduaneiro de sua competência. A ordem é para autoridade federal que detém o poder de conceder o desembaraço aduaneiro. Esta matéria encontra precedentes neste Tribunal, sendo objeto, inclusive, de Súmula. O contribuinte portador do mandado judicial apenas não necessitava recolher o ICMS antes do desembaraço, mas o imposto, segundo a legislação deveria ser recolhido por ocasião da disponibilidade da mercadoria.O contribuinte confirma a prática de adjudicar-se de valores constantes de Notas Fiscais de Entrada sem que o imposto respectivo tenha sido recolhido aos cofres estaduais.
A diferença relativa ao momento da ocorrência do fato gerador teve como base o valor constante da GIA com recolhimento postergado. A recomposição do ICMS devido trouxe como conseqüência a redução dos valores constantes como créditos por importação, ocasionando na reconstituição das GIAs, eventuais saldos devedores.
Desprovimento do recurso voluntário.
UNANIMIDADE.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de recurso voluntário, em que é recorrente (...), de Gravataí (RS), e recorrida a FAZENDA ESTADUAL.
Em nome do contribuinte acima identificado foi lavrado, com ciência em 23.02.95, o Auto de Lançamento nº 0000104019, datado de 22 de fevereiro de 1995, na cidade de Gravataí, em razão de lançamento complementar ao de nº 6999400010, pelo não recolhimento do ICMS na data da entrada das mercadorias no estabelecimento do importador, pela impetração de mandado de segurança com obtenção de liminares junto a Justiça Federal, que autorizavam o desembaraço aduaneiro sem a comprovação do recolhimento do imposto. A complementação deve-se ao fato de ter sido considerado como data da ocorrência do fato gerador da entrada no estabelecimento ao passo que a legislação determina no momento do recebimento pelo importador. Faz parte do mesmo Auto de Lançamento outro item, apontando apropriação indevida de créditos fiscais, em função de terem sido recalculados os valores lançados no Auto de Lançamento nº 6999400010. O contribuinte apropriou-se equivocadamente de créditos por pagamento antecipado, nas Guias de Informação e Apuração do ICMS (GIAs), em período de apuração anterior ao de seu pagamento. Os valores da multa e da atualização monetária, deduzidos do valor total pago, são os valores inclusos, mas não expressos, nas Guias de Arrecadação (GA), pelo pagamento dos tributos fora de prazo, conforme demonstrativo constante do crédito tributário. Como o vencimento do saldo devedor a recolher é dia 24 do mês subseqüente, pois o valor indevidamente creditado foi deduzido do saldo devedor nesta data.
O autuado discordando do procedimento fiscal, dentro do prazo legal, representado por procurador habilitado conforme mandato juntado (fl. 10), apresentou impugnação ao referido Auto de Lançamento, fls. 03 a 09, onde expõe as suas razões de fato e de direito. Apensando aos autos cópia reprográfica do contrato social da empresa. O contribuinte explica que no momento da entrada na fábrica creditou-se do ICMS destacado na Nota Fiscal de Entrada e efetuou o seu pagamento juntamente com o ICMS devido em face de suas vendas correspondentes ao mesmo período de apuração em curso ao da respectiva entrada. Afirma que o lançamento contém bis in idem ao considerar o cálculo da diferença gerada pelo crédito no dia da entrada para o dia do efetivo pagamento, lançado a correção entre estas duas datas e a multa de mora; e desconsiderou o crédito no dia em que foi realizado, já recomposto nos termos do item anteriormente mencionado, e o deu como eficaz no dia do pagamento. Demonstra a sistemática dada exemplificando, ter ocorrido um crédito no dia 28, por entrada da mercadoria de uma importância que foi paga no dia 24 do mês seguinte. Aduz que o Fisco fez o lançamento trazendo o valor pago para o dia do crédito, fazendo o deflacionamento, lançando a diferença entre a data deste crédito e o respectivo pagamento, apontando a diferença como valor devido na peça fiscal e que em face disto o item segundo, que reconstitui conta corrente fiscal não pode subsistir por constituir-se em dupla cobrança. Enfoca a aplicação da multa material básica como indevida por ter sido a matéria informada ao Fisco. Pede ao final a improcedência do lançamento.
A autoridade lançadora em extensa réplica propugna a legitimidade do procedimento tributário impugnado. Retruca os argumentos da impugnação informando que o contribuinte não recolheu o imposto no recebimento das mercadorias conforme determinava as liminares e, por isso, foi atuada, entende que a tese da aplicabilidade do acordo internacional do GATT não se aplica ao caso em tela, visto as mercadorias importadas entrarem no ciclo produtivo no recebimento pelo importador, quando se sujeita a primeira imposição fiscal e o recolhimento se impõe como instrumento de equiparação do produto estrangeiro ao produto nacional, cujas operações já foram submetidas ao gravame estadual. No que diz respeito à reconstituição do conta corrente fiscal manifesta-se favorável à manutenção do crédito tributário, pois o contribuinte apropriou-se indevidamente de imposto não recolhido. Na recomposição do conta corrente foi constatado saldos devedores não oferecidos à tributação. Contesta a duplicidade de lançamento trazendo, inclusive, exemplos dos cálculos que determinaram a constituição do crédito tributário referente a apropriação indevida.
O julgador monocrático estriba sua decisão na Constituição Federal, no Convênio ICM nº 66/88, na Lei nº 8.820/89 e no Regulamento do ICMS. Estes dispositivos são utilizados para dar guarida ao posicionamento quanto a exigência fiscal referente aos prazos de pagamento do imposto e admissibilidade de apropriação de créditos fiscais decorrentes de entradas no estabelecimento. Ao final propugna pela procedência do Auto de Lançamento, condenando o autuado ao pagamento da exigência tributária atualizada monetariamente nos termos da legislação aplicável, conforme Decisão nº 81195078, de fls. 80 a 88.
Cientificado em 06.11.95, na pessoa do gerente de contas e custos, comparece o sujeito passivo da condenação a este Tribunal para, em grau de recurso voluntário, com observância de forma e do prazo estipulados em lei, por seu procurador já qualificado nos autos, reclamar da decisão prolatada na primeira instância administrativa. Propugna pela preservação de todas razões de fato e de direito alegadas pelo contribuinte na impugnação.
Quanto ao momento da ocorrência do fato gerador do imposto defende que o mesmo, em função da determinação judicial (liminar em mandado de segurança) se anulou, pois a regra é o recebimento pelo importador, e tendo este respaldo do Poder Judiciário, liberando do recolhimento no desembaraço. Como conseqüência, no momento em que deu entrada a mercadoria no estabelecimento, não haveria regra tributária da ocorrência do fato gerador, ou seja, não há hipótese de incidência do ICMS prevista em lei para determinação do fato gerador do imposto no momento da entrada de mercadoria importada do exterior. Diante da inexistência de regra determinante do momento do pagamento do imposto, o contribuinte optou por recolhê-lo juntamente com o imposto devido por suas operações normais de circulação de mercadorias. Assegura, ainda, a aplicabilidade de acordo internacional, onde preconiza tratamento tributário não menos favorável que o concedido a produtos similares de origem nacional no que concerne a todas as leis, regulamentos e exigências que afetem a sua venda, colocação no mercado compra, transporte, distribuição ou uso no mercado interno. Preconiza a aplicação do disposto no art. 160 do CTN pela inexistência de regra expressa para a hipótese concreta verifcada nos autos. Acrescenta sua inconformidade com relação a inclusão das despesas aduaneiras, as quais não foram incluídas na base de cálculo para fins de tributação do ICMS, argumentando que estes valores entraram no cômputo do preço final das mercadorias industrializadas, e sua cobrança antecipada acarreta mero diferimento. Ataca a decisão de primeira instância por entender seus argumentos falaciosos e contraditórios em si próprios. Defende que o pagamento antes da autuação caracteriza-se denúncia espontânea, aplicando-se por conseguinte o disposto no art. 138 do CTN. Com relação a multa apresenta os mesmos argumentos da peça exordial. Ao final pede a improcedência do lançamento e alternativamente a insubsistência da multa.
Nesta instância a Defensoria da Fazenda, representada pela Dra. Marcolina Maria Gerevini Dias, manifesta-se pelo desprovimento do apelo voluntário, aduzindo não aplicabilidade das normas relativas ao GATT, bem como não oferecerem óbices ao lançamento fiscal as ordens judiciais.
É o relatório.
Passo a proferir o voto.
O processo sob apreciação decorre de fatos concretos constatados pelo Fiscal de Tributos Estaduais e admitidos pelo próprio contribuinte. O imposto devido pela importação de mercadorias estrangeiras não foi recolhido nos prazos regulamentares, determinando a constituição do crédito tributário discutido.
Inicialmente, cabe ressaltar o conteúdo da determinação judicial, fato esse que serviu de suporte para fundamentação do recurso em análise. As ordens judiciais constantes dos autos (fls. 68 e 69) determinam abstenção ao impetrado de condicionar à comprovação do recolhimento do ICMS o desembaraço aduaneiro de sua competência. Assim, a ordem é para a autoridade federal que detém o poder de conceder o desembaraço aduaneiro. Esta matéria encontra precedentes neste Tribunal, sendo objeto, inclusive de Súmula.
O contribuinte de posse do mandado judicial estava dispensado de recolher o tributo antes do desembaraço aduaneiro, obrigatoriedade esta decorrente de convênio firmado entre a União e as unidades Federadas, na qual a Receita Federal exigia a comprovação do recolhimento do ICMS antes de conceder o desembaraço aduaneiro.
A concessão de liminar em mandado de segurança em momento algum alterou o momento da ocorrência do fato gerador do ICMS. A interpretação apresentada pelo contribuinte não se coaduna com o conteúdo do mandamento judicial. Nele apenas consta a abstenção de condicionar à comprovação, ou seja, as autoridades fazendárias da União estavam impedidas de exigir a referida comprovação.
Em momento algum a legislação tributária estadual modificada no que concerne ao momento da ocorrência do fato gerador. Ele continuou a persistir no momento do recebimento da mercadoria pelo importador. Na prática o contribuinte portador do mandado judicial apenas não necessitava recolher o ICMS antes do desembaraço, mas o imposto, segundo a legislação deveria ser recolhido por ocasião da disponibilidade da mercadoria.
Assim, inexistiu a pretensa falta de regra jurídica para fixar o momento da ocorrência do fato gerador do ICMS na importação de mercadorias do exterior. Prevalecendo o disposto no art. 4º, inciso I, da Lei nº 8.820, de 27 de janeiro de 1989, e alterações, com a redação dada pela Lei nº 9.101, de 05 de julho de 1990. O descumprimento dos ditames legais sujeitam ao infrator a imposição de multa, e demais acréscimos dele decorrentes.
Com relação a adjudicação do crédito fiscal destacado na Nota Fiscal de Entrada, este ato é desprovido de qualquer respaldo jurídico tributário. A apropriação de crédito fiscal decorrente de entrada no estabelecimento somente pode ocorrer quando efetivamente o imposto tiver sido recolhido. O contribuinte confirma a prática de adjudicar-se de valores constantes de Notas Fiscais de Entrada sem que o imposto respectivo tenha sido recolhido aos cofres estaduais.
Este fato caracteriza prática de infração a legislação tributária estadual, com conseqüente aplicação de penalidade. Esta punição está prevista na Lei nº 6.537, de 27 de fevereiro de 1973, e alterações, e não caracteriza-se infração privilegiada conforme preconiza o contribuinte. Não houve antecipação ao Fisco ao recolher a título de imposto as quantias constantes das Guias de Informação e Apuração do ICMS. A tipificação da penalidade enquadra-se naquelas de natureza material básica por não ter recolhido no prazo correto.
Pertinente a duplicidade de cobrança em decorrência do crédito tributário apresentar dois itens relacionados, os argumentos do contribuinte não encontram respaldo técnico. O Auto de Lançamento compõe-se de duas partes distintas: a primeira, demonstra os valores recolhidos a menor em função do pagamento fora do prazo previsto na legislação, onde são calculados os valores devidos tomando-se como momento da ocorrência do fato gerador, e não o constante de outro crédito tributário ao considerar a entrada no estabelecimento como o respectivo momento; e a segunda, é a reconstituição do conta-corrente fiscal, necessário tendo em vista as modificações pelas apropriações indevidas de valores não recolhidos nos termos do Regulamento do ICMS.
Não há pelos cálculos e planilhas constantes do Auto de Lançamento valores cobrados duas vezes como afirma o contribuinte. O montante apurado pelo autuante corresponde aos valores deixados de serem recolhidos em função do aproveitamento do ICMS pelas entradas. Estas por sua vez, foram devidamente recalculadas no item I da peça fiscal e corretamente deduzidas no item II do lançamento tributário.
O procedimento tributário está muito claro. Quando foi apurada a diferença relativa ao momento da ocorrência do fato gerador, o autuante tomou como base o valor constante da GIA com recolhimento postergado, considerando-o como recolhimento parcial com a respectiva multa moratória. Em face deste cálculo, o principal modificou, ou seja, ficou menor. A diferença entre o valor devido e o recolhido a menor consituiu-se na primeira parte do Auto de Lançamento.
Como decorrência, os valores constantes como créditos por importação também sofreram redução, ocasionando na reconstituição das GIAs, eventuais saldos devedores. Estes valores não estão computados na primeira parte do Auto de Lançamento, pois referem-se a imposto devido por outras operações de circulação de mercadorias.
Para finalizar, a manifestação do contribuinte a respeito da decisão recorrida, entendo inócua, visto as afirmações nela contidas não constarem da fundamentação do presente processo. E, ainda, que não se referindo, entendo a letra "a" aplicável ao caso em tela, visto que a decisão judicial que determinou a inexigibilidade do pagamento do ICMS no momento da ocorrência do fato gerador não diz respeito ao Fisco estadual, e portanto as autoridades administrativas estão desobrigadas de acatá-las.
Isto posto, nego provimento ao recurso voluntário, mantendo integralmente os valores constantes do crédito tributário hostilizado.
Ante o exposto, ACORDAM os membros da Segunda Câmara Suplementar do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais, por UNANIMIDADE DE VOTOS, em negar provimento ao recurso voluntário, confirmando in totum o Auto de Lançamento.
Porto Alegre, 08 de agosto de 1996.
Edgar Norberto Engel Neto
RelatorPedro Viana Pereira
Presidente
Participaram, também, do julgamento os Juízes Francisco Martins Codorniz Neto, Adalberto Cedar Kuczynski e Cândido Bortolini. Presentes as Defensoras da Fazenda Marcolina Maria Gerevini Dias e Alice Grechi.