BORRADOR
Controle Interno

RECURSO Nº 3.160/95 - ACÓRDÃO Nº 1.428/96

RECORRENTE: (...)
RECORRIDA: FAZENDA ESTADUAL (Proc. nº 11791-14.00/93.2)
PROCEDÊNCIA: PASSO FUNDO - RS
EMENTA: ICMS

Arbitramento.

A utilização de formulários de controle interno para documentar vendas de mercadorias, omitindo-se as operações à tributação do imposto, habilita o Fisco a arbitrar o montante das saídas realizadas pela contribuinte por conta daqueles documentos. Neste sentido, afora os ajustes na determinação do imposto devido e a apresentação de alguns daqueles formulários ainda não utilizados, nada a reparar no procedimento do Fisco, mormente quando, no curso do processo, não foram apresentadas provas convincentes a descaracterizar a infração praticada.

Preliminares rejeitadas.

Recurso voluntário parcialmente provido.

Decisão unânime.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de recurso voluntário, em que é recorrente (...), de Passo Fundo (RS), e recorrida a FAZENDA ESTADUAL.

Em 30.04.93, em nome de (...), foram lavrados os Autos de Lançamento nºs 5649300158 (fls. 18 a 25), 5649300166(fls. 26 a 32) e 5649300174 (fls. 33 a 40), exigindo o recolhimento de imposto e multa por infração material qualificada. Consoante os Anexos das peças fiscais, a empresa fazia uso de documentário paralelo ao oficial para registrar saídas de mercadorias dos seus estabelecimentos, sendo que na matriz utilizava o denominado "Nota P-1", em uma filial "Nota Controle Interno" e, em outra filial, "P-1". Referidos documentos, conforme o Fisco, possuem características idênticas às das Notas Fiscais em uso e eram utilizados para acobertar parte das saídas de mercadorias omitidas a registro e tributação.

O documento "Nota P-1" foi impresso em duas oportunidades, sendo que, na primeira vez, foram confeccionados 500 (quinhentos) documentos - todos utilizados e, na segunda vez, 1000 (mil) documentos - mas não foram utilizados os de número 676 a 1000. Da "Nota Controle Interno" foram impressos 500 (quinhentos) documentos, sendo que não foram utilizados os de número 328 a 500. Enquanto que da "P-1" foram impressos 500 (quinhentos) documentos e todos foram utilizados. Considerando que somente foram apresentados ao Fisco os documentos em branco e visto que a contribuinte informou que todos os já utilizados foram extraviados, foi arbitrado o valor de cada operação documentada por aqueles formulários.

Informa ainda, a autoridade autuante, que a empresa já fora autuada anteriormente por apresentação de denúncia espontânea de infração e por omitir à tributação o primeiro pagamento nas vendas a prazo. Os dados constantes destes lançamentos serviram de base para determinar o valor médio, por operação, praticado pelo contribuinte, mas os valores neles consignados, a título de saídas sonegadas, foram todos deduzidos da parcela tributável dos Autos de Lançamento objeto do presente litígio. Também contribuiram na formação do preço médio por operação alguns daqueles documentos preenchidos e encontrados junto a clientes da empresa.

A empresa, no prazo e na forma da lei, impugna o lançamento e busca a decretação da sua total improcedência. Para tanto, alega que os documentos que serviram de base para a autuação são simples papéis de controle interno da empresa, não refletindo fato gerador do imposto. Acrescenta que os documentos, na medida em que utilizados, "...eram jogados fora por serem dispensáveis". Contesta a base de cálculo adotada manifestando o entendimento segundo o qual deveria ter sido considerado o preço de cada um dos documentos e não tomado o preço médio. Rebela-se, também, contra a forma de aplicação da correção monetária, dizendo que esta somente deveria incidir a contar da notificação do Auto de Lançamento. Por último, refere que a penalidade aplicada deveria ser de 50% (infração privilegiada), em virtude da apresentação anterior de denúncia espontânea.

A autoridade autuante, em réplica fiscal, manifesta-se pela mantença integral do valor lançado, fazendo, ainda, a juntada da documentação que serviu de base na auditoria (fichas de crediário, alguns documentos paralelos utilizados com declarações de clientes, cópia das peças fiscais fundadas na denúncia espontânea de infração, intimações e outros).

Na primeira instância, tendo por base as provas acostadas aos autos e visto que o Auto de Lançamento foi lavrado em obediência ao preceituado na legislação tributária, foi julgado procedente o crédito tributário constituído.

Dada a ciência da decisão e inconformada com o seu teor, a empresa interpôs recurso voluntário.

Em preliminar, alega que houve cerceamento de defesa porque sequer lhe foram alcançados os documentos basilares da autuação para extração de cópia e porque a decisão recorrida não abordou todos os seus argumentos e não buscou outros elementos de convicção quanto à procedência da acusação fiscal.

No mérito, buscando a total reforma da decisão recorrida, diz que foi induzida em erro quando da apresentação da denúncia espontânea de infração, tendo pago imposto em valor superior ao real; que os valores consignados no Auto de Lançamento relativo à denúncia espontânea de infração foram novamente considerados nas peças fiscais ora em discussão, havendo bitributação, o mesmo ocorrendo com as fichas de crediário; que muitos dos documentos paralelos tinham outra destinação que não a formalização de saídas de mercadorias, servindo, também, como meio de controle interno (avisos, reservas e cancelamentos); que os valores arbitrados são superiores aos reais, juntando documentos emitidos por processamento de dados, denominados de "Consultas dos clientes"; que as "Nota P-1" nºs 522 a 525, incluídas no arbitramento, não foram utilizadas, anexando as vias originais; que foram emitidas as Notas Fiscais correspondentes aos documentos paralelos, tendo localizado, agora, com muito esforço, quase todos os controles internos, fazendo a respectiva juntada aos autos; e, por último, afirma que os preços médios adotados na peça fiscal são irreais, já que não foi considerado adequadamente o período alto de inflação vigente à época, o que teria causado distorções.

Apreciados o autos pela Defensoria da Fazenda, diante da argüição da recorrente de que teria havido cerceamento de defesa e considerada a farta documentação juntada em grau de recurso, sugeriu a remessa dos autos à manifestação da autoridade autuante, no que houve acolhimento pela Presidência deste Tribunal e foram determinadas as providências cabíveis.

A autoridade autuante, ao seu turno, prestou a informação fiscal de fls. 2589 a 2599, anexando os documentos de fls. 2600 a 2640. Informa que, ao contrário do afirmado pela recorrente, todos os documentos entregues ao Fisco mediante protocolo foram devolvidos e aqueles apreendidos, com exceção das fichas de crediário, uma agenda de controle das vendas e "Notas de Controle Interno" e " Notas P-1" em branco, também foram todos devolvidos e sempre antes ou até a recorrente tomar ciência de Auto de Lançamento. Aduz que todos os documentos apreendidos sempre estiveram à disposição da autuada, conforme observação constante do próprio Auto de Lançamento.

Quanto à matéria de fundo, afirma que eventual erro de informação em denúncia espontânea de infração é assunto de outro lançamento, estranho ao presente feito; que os valores que lá serviram de base para a autuação não foram considerados neste lançamento, o mesmo ocorrendo quanto às fichas de crediário, que os formulários " consultas dos clientes", informatizados no próprio estabelecimento, não têm validade como prova fiscal, eis que podem ser forjados, citando como exemplo a diferença entre formulários apreendidos à época do lançamento (fls. 2617 2621) e os juntados, agora, em grau de recurso (fls. 1095 a 1215); que a vinculação de "notas de controle interno" com Notas Fiscais extraídas não prospera porque a impressão dos documentos paralelos (fls. 54 a 61) foi posterior à emissão das Notas Fiscais; que a juntada dos documentos "Nota P-1" de números 522 a 525, ainda não utilizados, mesmo apresentados somente agora, em grau de recurso, implica na decretação de insubsistência das parcelas correspondentes; que a juntada de cópia das 3ªs vias dos formulários "Nota P-1" (1023 a 1090 e 1791 a 2586), as quais foram vinculadas às Notas Fiscais de saídas de mercadorias, não servem como prova eis que, se comparadas com as vias anexadas pelo Fisco (fls. 45 a 52), constata-se que aqueles formulários não vieram da mesma chapa tipográfica, já que os transcritos no cabeçalho "Os Melhores Preços", bem como no rodapé "Nota P-1", além das pontuações no corpo dos formulários, não guardam similitude com os documentos originais, permitindo a conclusão de que sejam paralelos; que a 2ª via da "Nota P-1", de nº 485 (fl. 2640), guardada pelo Fisco como meio de prova, comparada com a sua 3ª via juntada pela recorrente (fl. 2314), corrobora a produção paralela de documentos, já que os valores e destinatários neles consignados são completamente diferentes; que as cópias dos formulários "P-1", de fls. 1217 a 1784, também juntados pela recorrente, os quais procura vincular com Notas Fiscais emitidas, se comparadas com as de fls. 65 a 73, apensadas pelo Fisco, guardam as mesmas características de impressão paralela como ocorreu com os documentos "Nota P-1", também não servindo como meio de prova; e que estranha o fato de somente agora terem aparecido referidos documentos, em que pese reiteradas vezes solicitados pelo Fisco quando da auditoria, o que somente confirma a sua produção posterior.

Retornados os autos a este Tribunal, a Defensoria exarou seu parecer técnico, através do qual propõe a rejeição da preliminar argüida e, no mérito, manifesta-se pelo provimento parcial do recurso voluntário para o efeito de excluir as parcelas relativas aqueles formulários não utilizados, nos moldes em que sugeriu a autoridade autuante.

É o relatório.

VOTO.

Quanto às preliminares.

Visto que, consoante as declarações de fls. 2600 a 2616, a recorrente recebeu grande parte dos documentos em devolução, inclusive antes do lançamento, sendo que a pequena parcela que ficou retida sempre esteve à disposição para consulta, improcede a alegação de que tenha ocorrido cerceamento de defesa.

Da mesma forma, diante dos argumentos e documentos alcançados ao julgador singular para proferir sua decisão, improcede a alegação da recorrente de que aquele julgado tenha sido omisso ou que tenha deixado de buscar outros elementos para a formação do seu convencimento.

Nesses termos, rejeito as preliminares argüidas. Acompanharam o Relator os demais juízes, pelos mesmos fundamentos.

Quanto ao mérito.

Inicialmente cabe registrar que definitivamente o Fisco, ao constituir o crédito tributário, em momento algum incluiu na base tributável valores que tenham integrado outros lançamentos, em especial o derivado de denúncia espontânea de infração. Assim foi, também, quanto às fichas de crediário, as quais tão-somente serviram como elemento para determinar o valor médio de cada saída documentada pelos formulários denominados pela empresa de "controle interno", além dos valores constantes do Auto de Lançamento objeto da denúncia espontânea de infração. Aliás, qualquer discussão acerca desse lançamento é impertinente ao presente litígio devendo, a recorrente, se assim entender e for oportuno, peticionar em separado.

Adentrando na questão de fundo, exsurge dos autos que o Fisco, diante da constatação que a contribuinte, nos seus diversos estabelecimentos, fazia uso de documentário paralelo para registrar as saídas de mercadorias, auditou a empresa para verificar se deste seu procedimento estaria decorrendo lesão ao Erário Público Estadual. Para tanto, foi a empresa intimada a apresentar todos aqueles formulários os quais, aliás, guardam semelhança estreita com uma Nota Fiscal, sendo que esta respondeu por escrito que somente teria os formulários em branco e que, os já preenchidos, teriam sido inutilizados (fls. 87 a 88). Diante da negativa da apresentação daqueles documentos já utilizados e presente os documentos juntados pelo Fisco às fls. 42 a 73, entre os quais encontram-se formulários paralelos utilizados e documentando vendas sem a emissão da correspondente Nota Fiscal, inclusive com declarações de clientes dando conta que não receberam a respectiva Nota Fiscal, o Fisco arbitrou as saídas ocorridas por conta daqueles documentos utilizados e não apresentados ao Fisco.

São esses os fatos e nada há a censurar no procedimento fiscal assim levado a efeito. Primeiramente, porque, nos termos do artigo 37, I, da Lei nº 6.485/72, presentes os pressupostos a habilitar o arbitramento do montante das operações realizadas pela recorrente. Depois, porque tendo por base dados constantes em lançamentos anteriores, fichas de crediário apreendidas e formulários paralelos buscados junto a clientes, o Fisco arbitrou as saídas com base em elementos ponderáveis. E, por último, antes de constituir o crédito tributário, oportunizou à empresa esclarecer os fatos e apresentar referidos documentos, no que houve resposta satisfatória.

Naturalmente, em se tratando de arbitramento, é o mesmo suscetível de questionamento diante da apresentação de provas cabais da inocorrência do acusatório fiscal. E tal direito, diga-se de passagem, foi plenamente exercido pela recorrente, mas não o suficiente a descaracterizar a imposição tributária. Com efeito, não resta provado nos autos que alguns dos documentos paralelos tiveram outra destinação que não aquela preconizada pelo Fisco. Os documentos "Consultas dos Clientes" , como bem observado pela autoridade autuante, não se constituem em prova válida, porquanto informatizados no próprio estabelecimento e facilmente produzíveis após a ocorrência dos fatos. Aliás, comparando-se alguns destes formulários apreendidos por ocasião da auditoria com os apresentados agora, em grau de recurso, verifica-se diferenças entre os mesmos (fls. 1095 a 1215 e 2617 a 2621).

Diferente não é quanto a juntada, também, agora, em grau de recurso, dos denominados controles internos ("Nota P-1", "Nota Controle Interno" e "P-1" ), de numeração dentre aqueles utilizados e motivo do arbitramento, os quais a recorrente procura vincular com Notas Fiscais emitidas pela empresa, eis que estes, ao que tudo indica, foram impressos paralelamente, não merecendo crédito como meio de prova. Tal convencimento não se forma só pela estranheza de os mesmos, apenas para argumentar, terem sido encontrados subitamente agora, para apreciação neste tribunal, já que a empresa foi reiterada vezes, na época própria, intimada a entrega-los ao Fisco e expressamente declarou te-lôs inutilizado. Mas, fundamentalmente, verifica-se tratar-se de prova forjada considerada a minuciosa análise procedida nesses documentos pela autoridade autuante, nas informações complementares produzidas a pedido deste Tribunal, cujas conclusões foram relatadas e aqui são adotadas como razão de decidir.

Contudo cabe acatar o pedido da recorrente no que tange aos documentos "Nota P-1", de nºs 522 a 525, os quais foram apresentados em grau de recurso e comprovadamente não foram utilizados pela empresa. Como integraram o arbitramento fica a exigência tributária constante no Auto de Lançamento nº 5649300158 reduzida, em valores da época, a Cr$ 881.841.542,60 de ICMS e Cr$ 1.763.683.085,20 de multa, insubsistindo Cr$ 3.481.761,45 de ICMS e Cr$ 6.963.522,90 de multa.

Também tem razão a recorrente quando questiona os cálculos envolvendo a determinação da base tributável e correção monetária dos valores constantes do Auto de Lançamento nº 5649300166. Ocorre que algumas das operações de saídas de mercadorias consideradas para a determinação do preço médio utilizado no arbitramento são até posteriores ao período auditado. Assim, visto o período inflacionário vigente à época, a sua atualização monetária pelos índices monetários médios do período acarretou distorções na apuração do "quantum" devido. Destarte, são ajustadas as parcelas devidas, aplicando-se a correção monetária somente a contar de outubro de 1991, em razão do que, em valores da época, fica a exigência tributária consubstanciada através do Auto de Lançamento nº 5649300166, reduzida a Cr$ 847.563.522,21 de ICMS e Cr$ 1.695.127.044,43 de multa, insubsistindo o restante do crédito tributário.

Assim sendo, dou provimento parcial ao recurso voluntário para o efeito de, em valores e moeda da época do lançamento, insubsistir Cr$ 3.481.761,45 de ICMS e Cr$ 6.963.522,90 de multa, relativamente ao Auto de Lançamento nº 5649300158, e Cr$ 1.021.596.111,11 de ICMS e 2.043.192.222,21 de multa, no que tange ao Auto de Lançamento nº 5649300166.

Ante o exposto, ACORDAM os membros da Primeira Câmara do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais, por UNANIMIDADE DE VOTOS, em rejeitar as preliminares argüidas e, no mérito, dar provimento parcial ao recurso voluntário, para o efeito de acatar os documentos 522 a 525 (AL nº 5649300158) e adequar a correção monetária aos documentos que serviram de base de cálculo ao arbitramento (AL nº 5649300166).

Porto Alegre, 29 de maio de 1996.

Renato José Calsing
Relator

Roque Joaquim Volkweiss
Presidente

Participaram, também, do julgamento os Juízes Pery de Quadros Marzullo, Levi Luiz Nodari e Antonio José de Mello Widholzer. Presente o Defensor da Fazenda Galdino Bollis.

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