NOME SOCIAL E O TRABALHO

Sumário

1. Introdução;
2. Identidade De Gênero – Travesti E Transexual;
3. Direito Ao Uso Do Nome Social;
4. Profissões Regulamentadas;
5. Esocial;
5.1. Validações Do Nome Do Trabalhador;
5.2. Evento S-2200 – Cadastramento Inicial Do Vínculo E Admissão;
5.3. Evento S-2205 – Alteração De Dados Cadastrais Do Trabalhador;
6. Lei Geral De Proteção De Dados (LGPD);
7. Garantias Fundamentais;
8. Utilização Do Nome Social – Posição Do Ministério Do Trabalho E Previdência.

1. INTRODUÇÃO

As empresas têm que se adequar a todas as mudanças que ocorrem ao longo dos anos com a sociedade, até mesmo para que cumpram o seu papel social com os trabalhadores.

Assim, é obrigação dos empregadores acompanhar a evolução da legislação e garantir aos seus trabalhadores todos os seus direitos.

Especificamente quanto aos direitos dos trabalhadores que fazem parte da comunidade LGBTQIAP+ (lésbicas, gays, bissexuais, trans, queer, intersexuais, assexuais, pan e mais), houve grandes avanços.

Talvez uma das maiores conquistas desses trabalhadores é a possibilidade de adoção do seu nome social, ou seja, a designação pela qual a pessoa trans se identifica e é socialmente reconhecida, condizente com sua identificação sexual, diferentemente do nome que consta em sua Certidão de Nascimento.

O Conselho Nacional de Justiça, no Provimento n° 73/2018, facilitou o procedimento de retificação da certidão de nascimento para pessoa transgênero, que pode ser diretamente requerida pelos maiores de 18 anos nos Cartórios de Registro Civil de Pessoas Naturais.

No entanto, apesar de não haver nenhuma previsão específica a respeito na legislação trabalhista, o entendimento é de que a adoção do nome social, caso o trabalhador necessite, ainda que ele não tenha solicitado a inserção em sua documentação, é de suma importância, até mesmo para a autoestima do mesmo, já que há um impacto direto na sua vida, na forma com que se identifica e como é identificado pelos colegas de trabalho e pelo público externo.]

Sendo assim, adotar o nome social na empresa é, não apenas, uma demonstração de respeito e acolhimento por parte do empregador, mas também resulta em uma melhoria no ambiente corporativo, com impactos no rendimento pessoal do empregado, que se sente valorizado, além de prevenir a empresa de eventuais reclamatórias trabalhistas e futuras condenações por danos morais, por exemplo.

2. IDENTIDADE DE GÊNERO – TRAVESTI E TRANSEXUAL

Identidade de gênero é a compreensão da pessoa sobre ela mesma, é a maneira como se vê e deseja ser reconhecida, podendo ou não concordar com o gênero de nascimento, ou seja, com seu sexo biológico.

Travestis e transexuais (femininos e masculinos) são os que mais sofrem com a discriminação e o preconceito vivenciados pela população LGBTQIAP+, em razão da intolerância à identidade de gênero.

Transexual é o indivíduo que não se identifica com o gênero assinalado no nascimento, podendo ou não, buscar procedimentos médicos e estéticos, como a cirurgia de readequação sexual e a terapia hormonal, para adequar o corpo ao gênero ao qual pertence.

O termo travesti é utilizado apenas para pessoas transexuais com identidades femininas.

Como se trata de uma parte da população que é, muitas vezes, marginalizada, em função do preconceito à sua condição, as oportunidades no mercado do trabalho acabam sendo restringidas, fazendo com que assumam postos informais, ainda que tenham qualificação e capacitação para estarem em um nível superior.

3. DIREITO AO USO DO NOME SOCIAL

A utilização do nome social de pessoas travestis e transexuais, considerando a sua autodeterminação sobre o modo de tratamento de sua identidade de gênero é a garantia de um direito para aqueles que são deixados de lado em razão da sua condição e demonstra um grande passo no desenvolvimento do acompanhamento socioassistencial.

O Decreto n° 8.727/2016 trata especificamente do uso do nome social, bem como do reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública federal.

Como não existe uma legislação específica no âmbito das empresas privadas, o referido Decreto é aplicado por analogia, tendo em vista que a adoção do nome social por parte do empregador demonstra que está empenhado em proteger seus empregados, um dos papeis que lhe compete, além de proporcionar um ambiente de trabalho saudável e agradável para todos.

Portanto, o entendimento é de que, ainda que o trabalhador não tenha feito a alteração definitiva do seu nome, através de processo judicial ou diretamente no Cartório, no crachá e demais documentos com acesso de terceiros, conste o nome social, ainda que junto com o nome que consta na Certidão de Nascimento.

Certamente o uso de um crachá em que o empregado é identificado com o nome com que gosta de ser chamado, considerando a maneira como ele mesmo se identifica e não de acordo com seu nome “oficial”, faz com que se sinta confortável para desempenhar suas funções da melhor maneira possível.

4.PROFISSÕES REGULAMENTADAS

Atualmente já existem determinações específicas de alguns Órgãos de Classe relacionados a profissões regulamentadas sobre a utilização do nome social pelos profissionais da categoria.

Os profissionais da psicologia travestis e transexuais podem ter o nome social destacado na frente da carteira de identidade emitida pelos Conselhos Regionais de Psicologia, conforme garante a Resolução CFP n° 14/2011.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), na Resolução n° 5/2016, também permite que advogados inscritos em seu quadro funcional utilizem o nome social no exercício da profissão e em seus documentos de identificação profissional.

A Resolução CFESS n° 785/2016, que diz respeito aos serviços de Assistência Social, estabelece a inclusão e o uso do nome social de assistente social travesti e transexual no Documento de Identidade Profissional (DIP).

Da mesma forma, o Conselho Federal de Economia, conforme Resolução n° 2000/2019, regulamenta e autoriza a adoção de nome social pelos profissionais da categoria.

Portanto, o uso do nome social tem se tornado cada dia mais comum, tendo em vista que garante ao seu portador, ser tratado com respeito e com dignidade.

5. ESOCIAL

A legislação trabalhista não tem disposição expressa quanto à utilização do nome social pelos trabalhadores.

No entanto, como vem sendo cada vez mais garantida essa possibilidade, os sistemas de informação também estão se adequando à essa realidade, atendendo às demandas e aos avanços sociais.

O artigo 14, inciso II, alínea ‘a’ da Portaria MTP n° 671/2021 determina que os dados do trabalhador, como nome completo, sexo, grau de instrução, endereço, nacionalidade, raça, cor e nome social, desde que solicitado pelo empregado, devem ser informados no eSocial até o dia 15 do mês subsequente ao da admissão.

5.1. Validações do nome do trabalhador

De acordo com o Manual de Orientação do eSocial (versão S-1.2, dezembro/2023, página 12), o nome do trabalhador a ser utilizado deve ser o seu nome civil, mesmo que o nome social já tenha sido atualizado na base do CPF, considerando que quando da consulta cadastral, a validação do nome é realizada na base do CPF que retorna sempre o nome civil do trabalhador.

Portanto, apenas quando houver retificação/substituição judicial do nome civil é que o novo nome deve ser utilizado na consulta qualificação cadastral.

5.2. Evento S-2200 – Cadastramento inicial do vínculo e admissão

De acordo com o Manual de Orientação do eSocial (versão S-1.2, dezembro/2023, página 215), quando o trabalhador manifestar sua vontade de inclusão de seu nome social no cadastro, este deverá ser informado no campo {nmSoc}.

Assim, no evento S-2200 (Admissão), nos campos pertinentes ao trabalhador, no campo {nmSoc} deve ser inscrito o nome social do travesti ou transexual, conforme abaixo:

nome_social_e_o_trabalho_34_03_2024

No entanto, a aceitação do evento é condicionada à validação dessa informação no cadastro do CPF na RFB.

5.3. Evento S-2205 – Alteração de dados cadastrais do trabalhador

As alterações dos dados cadastrais do empregado são feitas através do evento S-2205 do eSocial.

No referido evento são alteradas informações como documentação pessoal, escolaridade, estado civil etc.

Assim, o registro desse evento é primordial no cadastramento do nome social, caso haja retificação por parte do empregado, já que, na sua recepção, o eSocial valida as informações do CPF, nome e data de nascimento do trabalhador no cadastro do CPF na Receita Federal.

Caso sejam encontradas divergências, o evento é rejeitado.

Deste modo, o evento S-2205 só pode ser enviado depois que o cadastro do CPF junto à Receita Federal estiver atualizado, conforme demonstra a informação contida nos Leiautes:

nome_social_e_o_trabalho_34_02_2024

 

A alteração dos dados cadastrais do trabalhador, deve ser feita através do evento S-2205, que deverá ser transmitido até o dia 15 do mês subsequente ao mês de referência.

6. LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS (LGPD)

O artigo 5º da Lei n° 13.709/2018, conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados, prevê que todo dado pessoal sensível, ou seja, toda informação inerente à pessoa natural que faça referência a suas convicções étnicas-raciais, políticas, religiosas, sobre sua saúde ou vida sexual, deve receber um tratamento diferencial de confidencialidade.

Apesar de não haver determinação específica a respeito, entende-se que o nome social também tem essa qualidade de dado sensível, já que se trata de um dado íntimo do indivíduo, demandando um tratamento diferenciado por parte das instituições públicas e privadas, ficando seu uso condicionado à prévia autorização e atenção ao regramento legal, sob pena de ser considerado um ato discriminatório.

7. GARANTIAS FUNDAMENTAIS

A utilização do nome social pelos indivíduos é garantida a todos aqueles que o quiserem adotar, independentemente de ter ou não havido a cirurgia para adequação de sexo.

Portanto, o direito ao uso do nome social deve ser garantido aos cidadãos, não importando questões físicas ou biológicas, devendo ser respeitada a maneira como a própria pessoa se identifica, com base na proteção à dignidade da pessoa humana, nos termos da Constituição Federal Brasileira e do artigo 18 da Convenção Americana de Direitos Humanos, um dos instrumentos mais importantes no âmbito internacional de Direitos Humanos.

8. UTILIZAÇÃO DO NOME SOCIAL – POSIÇÃO DO MINISTÉRIO DO TRABALHO

A legislação trabalhista não tem nenhuma previsão específica sobre a utilização do nome social no ambiente de trabalho.

No entanto, uma das obrigações dos empregadores é proteger seus trabalhadores, física e mentalmente, proporcionando um ambiente de trabalho saudável e agradável, para que todos possam desempenhar suas funções da melhor maneira possível.

A utilização do nome social é uma das maneiras de proteção e respeito ao empregado, demonstrando que se encontra em um ambiente livre de preconceito e que não haverá nenhum tipo de discriminação quanto à sua condição.

Tanto é assim que o Ministério do Trabalho (MTE) tem uma cartilha de perguntas e respostas que trata especificamente de questões relacionadas à não discriminação no ambiente de trabalho.

A cartilha pode ser acessada e:

https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/assuntos/inspecao-do-trabalho/manuais-e-publicacoes/perguntas_e_respostas_sobre_discriminacao_no_trabalho.pdf/view

Na pergunta n° 36 do material se dá o questionamento sobre a adoção do nome social e tratamento dos empregados pelo nome que reflita sua identidade de gênero.

nome_social_e_o_trabalho_34_01_2024


Deste modo, ainda que não exista disposição específica na lei a respeito, o empregador que se negar a aceitar a adoção do nome social do empregado que assim solicitar, poderá configurar uma prática discriminatória, com consequências sérias em caso de uma Reclamatória Trabalhista ou até mesmo de uma fiscalização.

Portanto, é dever dos empregadores zelarem pelos seus empregados, fazendo tudo o que estiver ao seu alcance para lhes propiciar um bom ambiente para trabalhar.

 
Fundamentos Legais: Os citados no texto, conforme legislação vigente à época da publicação.

Agosto/2024