ACIDENTE DE TRAJETO
Sumário
1. Introdução;
2. Caracterização;
2.1. Comparativo Histórico;
2.2. Consequências Do Enquadramento Como Acidente De Trabalho;
3. Responsabilidade Do Empregador;
4. Recusa Do Empregador Em Configurar Como Acidente De Trabalho;
4.1. Consequências Da Abertura Do CAT
5. Reflexos No Contrato De Trabalho;
5.1. Garantia Provisória Do Emprego;
5.2. Contagem Do Tempo De Contribuição;
5.3. Remuneração Do Empregado;
5.4. Contribuição Previdenciária Do Empregado E Da Empresa;
5.5. FGTS Do Empregado;
6. Abertura Da CAT;
6.1. Prazos;
6.2. Informação Via Esocial.
1. INTRODUÇÃO
Acidente de trajeto é o acidente ocorrido no deslocamento do empregado de sua residência para o trabalho ou do trabalho para a residência.
O referido acidente, nos termos do artigo 21, inciso IV, alínea ‘d’ da Lei nº 8.213/1991, é equiparado a acidente de trabalho.
2. CARACTERIZAÇÃO
O acidente de trajeto se caracteriza quando ocorre no trajeto habitual de deslocamento do empregado da sua residência para o trabalho ou vice-versa.
Desta forma, caso o acidente ocorra fora do trajeto habitual, não será considerado acidente de trajeto.
Por exemplo, se o empregado, ao sair do trabalho, decide ir ao shopping, antes de voltar para casa e sofre um acidente neste percurso, o acidente de trajeto não será caracterizado.
Outra forma utilizada para caracterizar o acidente de trajeto é o critério temporal.
Sendo assim, considerando as possíveis rotas de deslocamento do empregado, a empresa deverá levar em conta um tempo mínimo e máximo para realização do percurso, para analisar se há ou não caracterização do acidente de trajeto.
Portanto, sendo provado que o empregado estava fora do seu trajeto habitual, seja no que diz respeito à direção, quanto ao tempo necessário de deslocamento, o acidente não será configurado.
2.1. Comparativo Histórico
O acidente de trajeto é equiparado a acidente de trabalho, como determina o artigo 21, inciso IV, alínea ‘d’ da Lei nº 8.213/1991.
No entanto, com a publicação da MP nº 905/2019, por um determinado período, o acidente de trajeto deixou de ser considerado acidente de trabalho.
A referida MP, porém, foi revogada pela MP nº 955/2019 e com isso, seu texto perdeu a eficácia e o acidente de trajeto voltou a ser considerado acidente de trabalho.
Deste modo, a caracterização se dá de acordo com os referidos períodos:
Até 11.11.2019: acidente trabalho;
De 12.11.2019 a 20.04.2020: não é considerado acidente de trabalho;
A partir de 21.04.2020: voltou a ser considerado acidente de trabalho.
Portanto, dependendo da época em que ocorreu o acidente de trajeto, este poderá não ser considerado como acidente de trabalho.
2.2. Consequências do Enquadramento como Acidente de Trabalho
Em caso de acidente no percurso para o trabalho, o empregador deverá ser comunicado, pelo empregado, se em condições para tanto ou por seus familiares, e, havendo necessidade de afastamento das atividades, deverá ser apresentado o atestado médico.
O empregador, por sua vez, deve fazer a CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho), que tem como finalidade:
informar a Previdência Social sobre o acidente ocorrido com o segurado, nos termos dos artigos 19 a 21 da Lei n° 8.213/1991;
disponibilizar dados ao INSS, a fim de se formar base estatística e epidemiológica dos acidentes e/ou doenças relacionadas ao trabalho e as principais ocorrências, como determina o artigo 169 da CLT;
garantir ao segurado o devido acesso ao benefício previdenciário, sendo que, para o acidente de trabalho, não há carência.
Ocorrendo o acidente de trabalho e sendo apresentado atestado médico superior a 15 dias, cabe à empresa o pagamento dos 15 primeiros, como determina o artigo 75 do Decreto n° 3.048/1999.
3. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR
Conforme o artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição Federal, dentre os direitos garantidos aos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, está o seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.
O referido artigo, como se pode observar, menciona a responsabilidade civil da empresa na ocorrência de acidente de trabalho derivado de dolo ou culpa.
No caso de acidente de trajeto, ainda que considerado um acidente de trabalho, a responsabilidade do empregador não é verificada, já que ocorre fora do ambiente de trabalho, ou seja, não há como imputar qualquer conduta à empresa na ocorrência do acidente.
4. RECUSA DO EMPREGADOR EM CONFIGURAR COMO ACIDENTE DE TRABALHO
Não é incomum que as empresas, ao serem comunicadas sobre eventual acidente de trajeto, contestem sua ocorrência.
O acidente de trajeto se configura quando ocorre no percurso habitual do empregado para deslocamento entre sua casa e o trabalho ou vice-versa.
Desta forma, caso o empregado não apresente nenhuma comprovação de que o acidente ocorreu no percurso residência-trabalho, o empregador poderá se recusar a enquadrá-lo como acidente de trabalho.
No entanto, ainda que o empregador não entenda que se trata de acidente de trajeto, sendo apresentado atestado médico, este deverá ser aceito, nos termos do artigo 6°, § 1°, alínea ‘f’, da Lei n° 605/1949.
Em caso de atestado médico superior a 15 dias, a empresa fará o pagamento dos 15 primeiros e a partir do 16º dia o empregado será encaminhado para a Previdência para o recebimento do benefício de auxílio por incapacidade temporária, conforme artigo 59 da Lei n° 8.213/1991.
A recusa do empregador em reconhecer o acidente de trajeto, porém, irá acarretar grandes implicações no contrato de trabalho do empregado, já que não haverá o recolhimento do FGTS durante o afastamento e nem a estabilidade prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/1991.
Deste modo, a recusa do empregador em reconhecer o acidente de trabalho poderá ser discutida judicialmente, cabendo ao juiz do processo analisar o caso concreto.
4.1. Consequências da Abertura do CAT
Outra consequência da recusa do empregador de enquadrar o acidente do empregado sofrido pelo empregado como acidente de trajeto será a não realização da CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho).
A CAT é a forma de comunicar ao INSS e demais órgãos sobre o acidente de trabalho e não será realizada sua emissão se o acidente sofrido pelo empregado não se configurar como acidente de trajeto.
Portanto, se o empregador fizer a CAT, a Previdência Social entenderá que houve o acidente de trabalho e fará o afastamento do empregado nestas condições.
De qualquer maneira, se o empregador não fizer a abertura da CAT, que é sua obrigação, esta poderá ser realizada pelos outros legitimados, que são o próprio acidentado, o médico, seus familiares, o Sindicato ou qualquer autoridade pública, conforme artigo 351, § 4º da IN INSS nº 128/2022.
5. REFLEXOS NO CONTRATO DE TRABALHO
O acidente de trabalho sofrido pelo empregado gera alguns efeitos no contrato de trabalho.
5.1. Garantia Provisória do Emprego
De acordo com o artigo 118 da Lei nº 8.213/1991, o empregado que retorna do benefício previdenciário decorrente de acidente de trabalho tem direito à estabilidade de 12 meses.
A estabilidade, como se vê no texto do artigo, está diretamente relacionada ao recebimento do benefício previdenciário.
Portanto, se o empregado sofrer um acidente de trabalho, mas não se afastar pela Previdência, não haverá estabilidade.
Em caso de contrato por prazo determinado também haverá a estabilidade de 12 meses decorrente do acidente de trabalho, nos termos da Súmula n° 378 do TST.
No período de estabilidade o empregado não pode ser dispensado sem justa causa.
O pedido de demissão somente será possível com a assistência do Sindicato, e, na ausência deste, do Ministério do Trabalho ou da Justiça do Trabalho, como determina o artigo 500 da CLT.
5.2. Contagem do Tempo de Contribuição
O período em que o empregado está afastado, recebendo o benefício do auxílio por incapacidade temporária acidentária será computado como tempo de contribuição, desde que, ao retornar do afastamento, haja contribuição previdenciária pelo empregado, para se enquadrar como período intercalado, conforme determina o artigo 19-C, § 1°, do Decreto n° 3.048/1999.
5.3. Remuneração do Empregado
A empresa, em caso de ser apresentado atestado médico superior a 15 dias, será responsável pelo pagamento dos 15 primeiros, nos termos do artigo 75 do Decreto n° 3.048/1999.
5.4. Contribuição Previdenciária do Empregado e da Empresa
A empresa fará o pagamento dos 15 primeiros dias de atestado médico e sobre estes, será descontada a contribuição previdenciária do empregado.
No entanto, a partir da competência de setembro de 2015, conforme o Parecer PGFN/ME/SEI n° 16.120/2020, não haverá incidência de contribuição previdenciária patronal (20%, alíquota RAT e Terceiros) sobre o pagamento dos 15 primeiros dias de atestado do empregado, desde que concedido o auxílio por incapacidade temporária.
O Parecer se alinha à decisão do STJ, que reconheceu a natureza indenizatória deste pagamento no REsp. n° 1.230.957/RS.
Além disso, os benefícios previdenciários, com exceção do salário-maternidade, não integram o salário de contribuição e não têm incidência de INSS, como previsto no artigo 214, § 9°, do Decreto n° 3.048/1999.
5.5. FGTS do Empregado
O artigo 28, inciso III do Decreto nº 99.684/1990 determina que, durante o afastamento por acidente de trabalho, deve ser mantido o recolhimento mensal do FGTS sobre o salário do empregado.
Ainda, conforme o parágrafo único do referido artigo, se houver reajuste salarial durante o período, o FGTS deverá ser recolhido sobre o valor reajustado.
Em caso de empregado com remuneração variável, será utilizada como base de cálculo para o recolhimento do FGTS, a média aritmética da remuneração auferia nos últimos 12 meses, com base no item 6.1.3.1 do Manual de Orientações - Recolhimentos Mensais e Rescisórios ao FGTS e das Contribuições Sociais (vigência 04.01.2022).
6. ABERTURA DA CAT
Ocorrendo o acidente de trajeto, o empregador é obrigado à emissão da CAT para comunicação aos respectivos órgãos.
Antigamente a CAT era feita em um formulário de papel, que era preenchido e protocolado na Previdência Social.
Posteriormente passou a ser emitida on line, pela página da Previdência Social e atualmente é transmitida pelo eSocial, através do evento S-2210, exceto para aqueles legitimados que não utilizam o referido sistema.
6.1. Prazos
O prazo para comunicação do acidente do trabalho pela empresa ou empregador doméstico, conforme determina o artigo 351, § 3º da IN INSS nº 128/2022, será até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência e, em caso de morte, de imediato, à autoridade competente, sob pena de multa aplicada na forma do artigo 286 do Decreto nº 3.048/1999.
Assim, se a empresa não observar o prazo de entrega da CAT, poderá ser notificada e multada.
6.2. Informação via eSocial
Os prazos de envio dos eventos de SST estão previstos na Portaria Conjunta SEPRT/RFB/ME n° 071/2021, conforme cronograma abaixo:
De acordo com a referida Portaria, as empresas do grupo 1 iniciaram o envio do evento S-2210 (CAT) em 13.10.2021 e os grupos 2 e 3 iniciaram o envio em 10.01.2022 e o grupo 4 passou a enviar o evento em janeiro de 2023.
O Manual de Orientação do eSocial (versão S-1.2, dezembro/2023) determina que as empresas que possuem empregados, os sindicatos quando tem trabalhadores avulsos, OGMO (Órgão Gestor de Mão de Obra) e órgãos públicos que contratem servidores vinculados ao RGPS (Regime Geral da Previdência Social), também têm a obrigatoriedade de informar o acidente de trabalho através das informações prestadas no evento S-2210 [Comunicação de Acidente de Trabalho].
Fundamentos Legais: Os citados no texto, conforme legislação vigente à época da publicação.
Fevereiro/2024