ABUSOS DO DIREITO SINDICAL

Sumário

1. Introdução;
2. Situações Abusivas do Direito Sindical;
2.1. Abuso do Direito de Greve;
2.2. Abuso do Direito de Liberdade De Associação;
2.3. Abuso do Direito de Cobrança De Contribuições;
2.4. Abuso do Direito de Denúncia;
2.5. Abuso do Direito de Previsão de Cláusulas Normativas Prejudiciais;
2.6. Abuso do Direito de Indicar A Inexistência De Incidências Tributárias Sobre Verbas;
3. Cláusulas Ilícitas em Norma Sindical;
4. Medidas Protetivas Contra Abusos do Direito Sindical.

1. INTRODUÇÃO

Dentre os vários princípios garantidos pela Constituição Federal de 1988 está o da liberdade sindical.

De acordo com o artigo 8° da Constituição Federal, é livre a associação profissional ou sindical, bem como, as organizações sindicais possuem liberdade de criação e funcionamento.

Sendo assim, não há interferência do Estado na formação e na condução das entidades dessa natureza.

No entanto, não é possível a existência de mais de uma entidade sindical situada na mesma base territorial do estabelecimento ou empresa.

Neste sentido, o artigo 516 da CLT determina que somente haverá um sindicato patronal e dos empregados para uma determinada localização.

Ainda, o artigo 8°, inciso V da Constituição Federal de 1988 prevê que ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato.

Em razão disso, toda e qualquer contribuição sindical, tais como assistencial, confederativa, contributiva, dentre outras, só é compulsória para aqueles que forem filiados ao Sindicato.

O objetivo da criação dos Sindicatos é a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas.

Assim, o artigo 513 da CLT determina que são prerrogativas dos Sindicatos:

a) representar, perante as autoridades administrativas e judiciárias os interesses gerais da respectiva categoria ou profissão liberal ou interesses individuais dos associados relativos à atividade ou profissão exercida;

b) celebrar contratos coletivos de trabalho;

c) eleger ou designar os representantes da respectiva categoria ou profissão liberal;

d) colaborar com o Estado, como órgãos técnicos e consultivos, na estudo e solução dos problemas que se relacionam com a respectiva categoria ou profissão liberal;

e) impor contribuições a todos aqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas.

Deste modo, a finalidade das entidades sindicais é proteger os direitos e interesses das categorias profissionais, mas existem situações em que há abuso de poder por parte dos Sindicatos.

Diante das referidas situações, as empresas e empregados que se sentirem prejudicados, podem tomar as medidas que entenderem cabíveis para sua proteção contra os abusos praticados pelos Sindicatos.

2. SITUAÇÕES ABUSIVAS DO DIREITO SINDICAL

Os artigos 186 e 187 do Código Civil Brasileiro (Lei n° 10.406/2002) trazem o conceito de ato ilícito.

O artigo 186 diz: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Já o artigo 187 determina: Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Portanto, consideram-se como abusivos, todos e quaisquer atos que ultrapassem os limites impostos pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Deste modo, Acordos e Convenções Coletivas poderão conter cláusulas que poderão ser consideradas abusivas e que não deverão ser respeitadas por empregadores e empregados.

2.1. Abuso do direito de greve

O artigo 9° da Constituição Federal assegura o direito de greve aos trabalhadores.

Assim prevê o referido artigo:

Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.

§ 1º A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.

§ 2º Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei.

Portanto, os trabalhadores têm o direito de greve garantido pela Constituição Federal e que, para alguns, é considerado um direito fundamental dos empregados.

O direito de greve decorre da democracia, da previsão da liberdade de trabalho e da autonomia dos sindicatos.

O artigo 6° da Lei n° 7.783/1989 prevê que os grevistas têm direito de utilizar meios pacíficos para convencer e atrair trabalhadores para participarem da greve, bem como, de arrecadar fundos e fazer a sua divulgação.

Ocorre que a realização da greve não pode atingir direitos e garantias fundamentais de terceiros, devendo ser respeitados certos limites.

Da mesma forma, os empregadores não podem intimidar os empregados que decidirem participar da greve, coagindo os mesmos para que compareçam ao trabalho e nem impedir que haja divulgação entre os trabalhadores.

Os grevistas, por sua vez, devem agir de modo que não cometam abusos.

O movimento de greve deve ser sempre pacífico, de modo a resguardas as instituições e principalmente os trabalhadores.

A ocupação desordenada de empresas inteiras ou de setores, o boicote e a obstrução da livre circulação de pessoas e de mercadorias, a violência contra o patrimônio, a sabotagem e tantas outras ações não podem ser tratadas como greve lícita, sendo consideradas abusivas e passíveis de punições com o rigor da lei.

Nestes termos, de acordo com os artigos 6°, 9°, 11 e 14 da Lei n° 7.783/1989, são mais comuns de serem praticados, por Sindicatos, empregados e empregadores, durante as greves, os seguintes abusos:

- recusa em realizar acordo para a preservação e a continuidade dos serviços, mesmo que a paralisação total acarrete prejuízo para a empresa de forma irremediável ou que seja indispensável ao atendimento das necessidades da comunidade;

- aplicação de meios violentos para atrair ou convencer os empregados, assim como violação a direitos e garantias fundamentais de outros, ameaça ou dano à propriedade ou à pessoa;

- coerção de empregados para que participem de piquetes de livre acesso ao trabalho ou até mesmo de arrastões que retirem do local de trabalho os empregados que não aderiram à greve; e

- manutenção da greve mesmo após determinação da Justiça do Trabalho para que seja encerrada.

2.2. Abuso do direito de liberdade de associação

O artigo 8º da Constituição Federal garante a todos os trabalhadores, bem como aos empregadores, a chamada liberdade sindical.

Portanto, nos termos da lei, ninguém é obrigado a se filiar ou se manter filiado a sindicato.

Ocorre abuso quando o Sindicato busca, de todas as formas, especialmente de maneira coerciva, obrigar que haja a filiação.

2.3. Abuso do direito de cobrança de contribuições

O artigo 513, alínea ‘e’ da CLT determina que é prerrogativa dos Sindicatos impor contribuições a todos aqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas.

No entanto, ainda que haja o direito do Sindicato em estabelecer a cobrança de contribuições, o mesmo não pode obrigar aqueles que não são filiados ao seu pagamento.

Sendo assim, as contribuições estabelecidas pelas entidades sindicais, como assistencial, taxa de reversão, taxa negocial, confederativa, contributiva, dentre outras, só são de pagamento obrigatório para os trabalhadores e empresas que se filiarem ao Sindicato.

Portanto, constitui abuso por parte do Sindicato, por exemplo, exigir o pagamento de contribuições daqueles que não são sindicalizados para ter acesso a cópias de Acordo ou Convenção Coletiva.

Inclusive, o artigo 611-B, inciso XXVI da CLT determina que caracteriza objeto ilícito de Acordo coletivo de Trabalho (ACT) ou de Convenção Coletiva (CCT), a cláusula que tem o objetivo de suprimir ou reduzir o direito à livre associação.

Além disso, nos termos dos artigos 579 e 582 da CLT, o desconto de contribuição sindical só pode ocorrer se expressamente autorizado pelo empregado.

Sendo assim, o Sindicato pode estabelecer contribuições em ACT ou CCT, mas deve determinar o procedimento de oposição a ser observado por aqueles que não estão obrigados e não querem realizar o pagamento.

De qualquer modo, a empresa, sem autorização do trabalhador, não poderá descontar nenhum valor de seu salário, sob pena de responder judicialmente a esse respeito.

2.4. Abuso do direito de denúncia

O artigo 626 da CLT prevê que o poder de fiscalizar o cumprimento da legislação nas relações de trabalho é do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) ou daqueles que exerçam funções delegadas.

Sendo assim, não é função do Sindicato a realização de fiscalizações, não tendo legitimidade para tanto, bem como, para solicitar a apresentação de documentos pelas empresas.

Desta forma, a fiscalização por parte dos Sindicatos é considerada uma prática abusiva, já que os mesmos não têm competência para tanto.

Ainda que o artigo 631 da CLT preveja o poder de denúncia ao representante legal de associação sindical, deverá estar amparada em fatos.

Caso o Sindicato, por exemplo, exija que a empresa desconte contribuições de empregados, sob pena de fazer uma denúncia, cometerá um abuso.

Nesta situação, cabe à empresa denunciar a entidade sindical à DRT (Delegacia Regional do Trabalho) da região.

2.5. Abuso do direito de previsão de cláusulas normativas prejudiciais

Todas as cláusulas previstas em normas coletivas devem estar de acordo com a legislação e com os princípios do ordenamento jurídico brasileiro, como o princípio da dignidade humana, o princípio da isonomia, o princípio da eficiência, a moralidade, dentre outros.

Desta forma, ainda que o artigo 611-A da CLT preveja que as normas coletivas têm prevalência sobre a lei ordinária em determinados assuntos, o Sindicato está sujeito ao cumprimento da legislação, constitucional e complementar, não tendo poder discricionário para realizar alterações que piorem as condições de trabalho.

Esse entendimento, inclusive, está previsto pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), no artigo 2°, item 2 da Convenção n° 98:

2. Serão principalmente considerados atos de ingerência, nos termos deste Artigo, promover a constituição de organizações de trabalhadores dominadas por organizações de empregadores ou manter organizações de trabalhadores com recursos financeiros ou de outra espécie, com o objetivo de sujeitar essas organizações ao controle de empregadores ou de organizações de empregadores.

Portanto, as cláusulas dos instrumentos coletivos devem ser estabelecidas nos termos da lei, visando sempre a proteção dos trabalhadores, mas de maneira que não gere prejuízo ou imponha determinadas situações aos empregadores.

2.6. Abuso do direito de indicar a inexistência de incidências tributárias sobre verbas

A legislação trabalhista, de modo geral, determina os valores que são ou não considerados salário, ou seja, a lei prevê o que integra ou não integra a remuneração do empregado e, consequentemente, sobre o que há ou não as incidências de INSS e FGTS.

Além disso, a competência para instituir tributos e encargos como a contribuição previdenciária e o FGTS é da União, nos termos do artigo 149 e artigo 22, inciso I, ambos da Constituição Federal, respectivamente, sendo privativa e indelegável.

Tanto é assim que o artigo 28 da Lei n° 8.212/1991 prevê o que é considerado salário de contribuição para fins de incidência de INSS e o artigo 221 da Instrução Normativa MTP n° 002/2021 determina o que está sujeito à incidência de FGTS.

Portanto, as normas coletivas não podem ter cláusulas que afastem a incidência de INSS e FGTS de determinadas verbas contrariando a lei e prejudicando o trabalhador.

Por exemplo, a CCT não pode prever que o empregador pode pagar o vale-transporte em dinheiro, o que é vedado pelo artigo 110 do Decreto nº 10.854/2021 e determinar que o valor não será considerado salário e não sofrerá as incidências previstas na legislação.

Assim, as cláusulas dos instrumentos coletivos que gerarem qualquer tipo de prejuízo aos trabalhadores serão consideradas abusivas e poderão ser questionadas, inclusive judicialmente.

3. CLÁUSULAS ILÍCITAS EM NORMA SINDICAL

A fim de evitar abusos por parte dos Sindicatos, a Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017) incluiu o artigo 611-B da CLT, que impede a inclusão de cláusulas, em instrumentos coletivos, a respeito de redução ou supressão de determinados direitos dos trabalhadores.

De acordo com o referido artigo, considera-se objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos:

- normas de identificação profissional, inclusive as anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social;

- seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;

- valor dos depósitos mensais e da indenização rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS);

- salário mínimo;

- valor nominal do décimo terceiro salário;

- remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;

- proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;

- salário-família;

- repouso semanal remunerado;

- remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% (cinquenta por cento) à do normal;

- número de dias de férias devidas ao empregado;

- gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;

- licença-maternidade com a duração mínima de cento e vinte dias;

- licença-paternidade nos termos fixados em lei;

- proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;

- aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei;

- normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho;

- adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas;

- aposentadoria;

- seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador;

- ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;

- proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência;

- proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;

- medidas de proteção legal de crianças e adolescentes;

- igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso;

- liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho;

- direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender;

- definição legal sobre os serviços ou atividades essenciais e disposições legais sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade em caso de greve;

- tributos e outros créditos de terceiros;

- as disposições previstas nos artigos 373-A, 390, 392, 392-A, 394, 394-A, 395, 396 e 400 da CLT, que se referem à proteção do trabalho da mulher.

4. MEDIDAS PROTETIVAS CONTRA ABUSOS DO DIREITO SINDICAL

O Ministério Público do Trabalho (MPT) tem como função a fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista quando houver interesse público, buscando regularizar e intervir nas relações entre empregados e empregadores.

Assim, compete ao MPT promover ações públicas no âmbito da Justiça do Trabalho com o objetivo de defesa de direitos coletivos e constitucionais garantidos a todos os trabalhadores.

Também cabe ao MPT se manifestar nos processos trabalhistas quando assim entender necessário.

Ainda, o MPT pode ser chamado a intervir como árbitro ou mediador em dissídios coletivos, podendo, ainda, fiscalizar o direito de greve nas atividades essenciais.

Outra função do MPT é receber denúncias acerca de condutas abusivas do sindicato, federação ou confederação, devendo averiguar a veracidade dos fatos.

Portanto, empregados e empregadores que se sentirem lesados ou que identificarem cláusulas ou práticas abusivas por parte dos Sindicatos, podem fazer a denúncia à DRT (Delegacia Regional do Trabalho) e ao MPT, que é órgão responsável pela apuração dos fatos e instauração de inquéritos, conforme cada caso.

Fundamentos Legais: Os citados no texto, conforme legislação vigente à época da publicação.

Setembro/2023